a comida de sempre

Devo ser a maior usuária deste blog, pois estou sempre entrando aqui para pegar receitas. Refaço muita coisa que já era originalmente vegetariano/vegano ou dou uma recauchutada, mudando alguns ingredientes. Não ando numa fase criativa na cozinha pras refeições, minha comida é sempre a mesma. Mas tenho explorado outros campos, feito muitos fermentados, desidratados, germinados e pão. No final do ano passado fiz mais duas levas grandes de azeitonas, que tenho usado em muitas receitas, saladas, pizza. Num dia em que fiz uma salada com erva-doce, laranjas ganhadas da minha vizinha e as azeitonas que eu mesma processei, caí na real que usar as próprias azeitonas é que é chique. Move over truffles! Também fiz duas versões de missô, uma delas [de abóbora] já ficou pronta, dei até alguns potinhos de presente. Ainda tenho o missô de grão-de-bico fermentando e envelhecendo––precisa esperar 6 meses no total e pra esse ainda faltam dois. É um exercício de paciência. No inverno descolei maneiras de arranjar cítricos, ou catando pela vizinhança ou pedindo, ou simplesmente ganhando. Teve aqui no inicio de janeiro uma tempestade fenomenal chamada de “bomba de ciclone” e muitas árvores caíram, como também muitas frutas. Uma das minhas vizinhas me chamou pra pegar os limões dela, que ela colheu e colocou em caixas. Fiz muitas coisas com eles, inclusive essa receita de limoncello & pepe. Já outras pessoas da vizinhança simplesmente podaram os galhos dos limoeiros e jogaram tudo na sarjeta, com os limões ainda pendurados. Não tenho pudores, peguei minhas cestinhas e sacolinhas e corri lá. Uma delas era de limão Meyer e fiz geléia, a marmalade que até levei de presente pra minha irmã e pra sogra dela em Portugal. Limão Meyer não é uma coisa muito comum fora da Califórnia. Outra árvore podada era de limão Siciliano, e espremi o suco e congelei, usei a casca desidratada pra fazer sal com limão e ervas. Não deixo nada ser desperdiçado. No inicio da primavera minha amiga que também mora aqui na minha cidade me chamou pra colher uns figos na figueira dela, que é daquelas que dão frutas que amadurecem secas, não são comestíveis. Quis tentar fazer aquele doce clássico brasileiro com os figos ainda verdes e deu certo. Refiz duas vezes, fiz o doce em calda e o cristalizado, que eu desidrato depois de fazer eles cozido na calda. Ficam maravilhosos. Com as folhas dos figos fiz licor. Ainda peguei mais figos numa árvore da cidade e noutra na fazenda orgânica. Não tem mais espaço para potinhos de figos em calda nas minhas geladeiras. Agora é a hora de colher morangos e vou lá na fazendinha, como faço todos os anos desde que me mudei pra Woodland. Daqui a pouco começam a chegar os tomates. Já percebi que gosto mais da rotina do que dos desafios, mas estou sempre incorporando alguns desafios na minha roleta de estações, que estão sempre chegando e indo embora, mesmo com os efeitos já perceptíveis das mudanças climáticas. Estou bem animada com a chegada do verão porque quero fazer novamente minhas uvas-passas. Já estou de olho em várias parreiras urbanas negligenciadas ou esquecidas na minha rota de caminhadas. Eu e as aranhas que aproveitamos bastante essas frutinhas que as pessoas plantam mas não colhem. E convenhamos que outra coisa chique demais é colocar as próprias uvas-passas no seu mingau de aveia, não é?

dias quentes & dias tórridos

Quando minha mãe morreu perdi imediatamente a vontade de comer e na sequência a vontade de cozinhar e de tirar fotos. Tudo o que eu mais faço e gosto. Fui voltando aos pouquinhos, comendo, cozinhando, fotografando e fazendo pequenos passeios pela região. No geral até que tive um verão bem agitado. Tive não, ainda estou tendo, pois neste momento em que escrevo está 46 graus celsius. Sim, QUARENTA E SEIS! Tivemos muitas heat waves neste verão, mas essa está sendo a pior, a mais longa e brutal. Por causa do calor, andei acelerando minha produção de fermentados e nas últimas semanas andei fermentando muitas frutas. Elas ficam deliciosas assim, boas pra comer com iogurte de coco no café da manhã. Também voltei a fazer pão e andei refazendo algumas receitas antigas, até adaptei uma receita que não era vegana e deixei ela melhor. Muito do que fiz neste verão foi me livrar de coisas que não significavam mais nada pra mim e entrei numa onda de limpeza. Doei toneladas de roupas, livros, sapatos, pratos, copos, reciclei zilhões de papéis, limpei, reusei, troquei, mudei. Aqui neste blog decidi arquivar todas as receitas com carne, frango e porco. Deixei as com peixes e ovos—até eu mudar de ideia. Muitas dessas receitas tinham históriazinhas pessoais anexadas, mas decidi que não valia a pena deixar nada apenas pela história. Porque minha maneira de ver o mundo mudou muito. Então foi tudo, receita com história e sem história. Não quero mais que esse blog ajude as pessoas a cozinharem com esses ingredientes. E aos poucos a vida vai ficando realmente mais simples e mais leve. Senti um alivio enorme quando me desfiz de uma quantidade absurda de roupas que vinha acumulando e guardando há anos, porque algumas tinham memória afetiva e outras porque eu realmente acreditava que ainda iria usar. Trabalhando em casa por tempo indefinido, não preciso mais ter tanta coisa. Acredito que é assim que vamos evoluindo, olhando pro passado sem melancolia ou saudade, planejando um futuro que faça mais sentido pra quem somos agora.