foi o esquilo que me encarou

Na frente da porta de entrada para a minha sala no meu trabalho tem um arbusto que se enche de pequenas flores no verão e que no outono viram frutos ovalados com uma cor verde bem escura. Esse arbusto é um pé de feijoa, uma fruta deliciosa também conhecida como goiaba mexicana. Eu levei muito tempo para me tocar que aquelas frutinhas eram feijoas, já que elas desaparecem rapidamente por serem vilmente atacadas e devoradas ainda verdes pelos esquilos.

Voltando da minha caminhada estica-pernas das três da tarde observei uma comoção esquilanesca nas proximidades do pé de feijoa. Foi quando peguei no flagra três esquilos, que já roiam covardemente as tais frutinhas. Minha presença e cara nada amigáveis fizeram com que dois dos esquilos se pirulitassem e fossem procurar por coisinhas comestíveis na grama de outra árvore mais próxima. Mas um deles não se moveu, ficou ali plantado e me encarou. O esquilo me encarou sem piscar, nem disfarçar, não abaixou a cabeça, não vacilou. Ele simplesmente me encarou. E eu encarei de volta, enquando ele subia pelos galhos da árvore, sem nunca virar a cabeça, sempre firme me encarando. O duelo de olhares durou alguns minutos. Foi emocionante. Não sei por que, mas eu tive quase certeza de que aquele esquilo era uma esquila.

sopa de feijão branco

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Uma sopa muito simples e muito boa, feita com feijões brancos do tipo Great Northern que ficaram de molho durante uma noite e depois foram cozidos na panela terracota junto com dentes de alho e folhas de sálvia em fogo baixo, até ficarem bem macios. Depois é só bater tudo no liquidificador, passar por uma peneira, adicionar mais água se necessário e salgar a gosto. Na hora de servir, temperar com bastante azeite bacanudo, do melhor que você tiver na sua despensa.

salada de espinafre e abóbora

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A cesta orgânica já engatou segunda e acelerou, entrando graciosamente no modo outono. Além dos vários tipos de abóbora, agora temos também as folhas verdes. Nesta semana chegaram um mação de espinafre, outro mação de rúcula, três tipos de verduras de cozinhar e um pé número 49 de alface crespa. Essa é a época do ano em que as noites de segunda-feira são desalentadoras, pois eu passo muito tempo em frente da pia lavando, lavando, lavando, lavando…

Para fazer valer todo o trabalho, nada mais natural que tívessemos uma saladona com folhas verdes para o jantar. Sobre uma cama de espinafre salpiquei cubinhos de abóbora [a butternut squash] que foi cozida no vapor. Azeitonas verdes temperadas com laranja vermelha, mais nozes colhidas outro dia na fazenda e pedacinhos de um excelente queijo azul feito em Point Reyes. O tempero foi vinagre de laranja, azeite com laranja vermelha e flor de sal. Ficou uma refeição completa.

The Olive Pit

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Depois do almoço no Granzella’s em Williams, dirigimos mais umas trinta milhas em direção ao norte, com destino à cidade de Corning no condado de Tehama, conhecida como the olive city—a cidade das azeitonas. Corning fica no meio de campos imensos de oliveiras e tem uma loja famosa que vende azeitonas e azeites de todos os tipos. Fiquei impressionada com a quantidade de maneiras diferentes de preparar as azeitonas, e com as inúmeras variedades que a loja oferecia. Comprei um azeite não filtrado feito com a variedade Arbequina e um outro feito com a variedade Mission prensada junto com laranjas vermelhas.
Um professor, colega do Uriel, nasceu em Corning e contou que a cidade não mudou nada desde o tempo em que ele era criança. Pudemos constatar o fato in loco. Achei fofo que muitas ruas tinham nomes de frutas. Mas a cidade é outra daquelas sem muitos atrativos, com uma rua principal bem larga, com cara de downtown dos anos 50. Pude até visualizar o Bill rebolando a pélvis num bailinho da escola pública de Corning ao som da sensação musical do momento—Elvis Presley.

Granzella’s

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A Califórnia não é só San Francisco, Los Angeles, Hollywood, Napa Valley. A Califórnia é também um estado agrícola, responsavel pelo abastecimento de gostosuras pelo país e mundo afora. Além do glamour dos lindos lugares turisticos e afamados, há também grandes extensões de terra cultivadas com arroz, tomates, amêndoas, azeitonas, nozes, muitas fazendas de gado e de frutas. É uma beleza de ver, apesar de não ser tão chamoso e não atrair nenhum turismo.
Quando o Uriel viaja pelas fazendas na Califórnia, ele e o grupo dele sempre acabam tendo que comer em lugares não muito refinados. Eles comem pela estrada, em lugares que servem comida pesada e porções gigantescas para caminhoneiros, lenhadores, trabalhadores da terra, gente que precisa repôr a energia perdida no trabalho braçal. Então quando ele achou esse restaurante italiano no meio do nada, com comida decente, uma deli que prepara sanduiches frescos e leves, uma lojinha com centenas de variedades de azeitonas e azeites, ele se sentiu num oásis. E quis que eu fosse lá conhecer o lugar.
O Granzella’s fica no meio dos campos de arroz, mais pro norte do estado, na cidade de Williams, condado de Colusa, com três mil e poucos habitantes. Nós fizemos um rápido tour pelo lugar, que num sábado à tarde parecia uma cidade fantasma, com a exceção da movimentação no Granzella’s e por um casamento mexicano acontecendo numa igreja simples numa esquina. O restaurante deve ser a única atração e a maior fonte de empregos da cidade. Um incêndio destruiu o local no ano passado, mas ele foi rapidamente reconstruído.
O Granzella’s é enorme e comporta um restaurante, uma deli, uma loja de quitutes e um sports bar que realmente me chocou, com centenas de cabeças de animais penduradas pelas paredes. A deli é bem famosa, onde você pode pedir sanduíches leves feitos com queijos e carnes frias e o pão fresquinho assado na padaria do lugar. Nós optamos pelo restaurante e não achamos nada especial, mas a comida era honesta. O Uriel pediu um nhoque que não impressionou. E eu pedi um steak, que na verdade eram quatro e vieram acompanhados de vagens cozidas no vapor e purê de batata com gravy, que veio por engano, pois eu tinha pedido batata frita. As fritas vieram como cumprimento mais tarde. Eu bebi um White Zinfandel e o Uriel uma Italian soda de morango. Os pratos incluiam o salad bar, que não tinha nada de diferente ou especial, a não ser pelas azeitonas temperadas. As porções eram enormes, fato normal em qualquer restaurante que sai do circuito refinado da California Cuisine.
A lojinha de guloseimas era tentadora, com mil e um tipos de azeites, até suco de azeitonas pra se colocar no Martini e Bloody Mary. Tomamos um gelatto e atravessamos a rua para visitar a lojinha de presentes do Granzella’s, que não achamos nada especial, pelo contrário, achamos meio cafonalha e bem careira. Mas eu comprei uns cremes para mãos feitos com azeite e com lavanda que me impressionaram pela delicadeza e perfume.

popovers de alho & alecrim

popover de queijo & alho
popover de queijo & alho
Essa receita veio impressa em alguma embalagem, que eu recortei e deixei na altura dos meus olhos, encaixada na fresta da porta de um dos armários, para poder lembrar de fazer em breve. Os popover são pãezinhos bem leves, que até lembram um pouco aquele pão de queijo de liquidificador, só que eles ficam mais sequinhos e com uma consistência mais firme. Mas crescem e abrem em formato de flor e ficam ocos por dentro, portanto ótimos para comer com algum tipo de recheio. Eles foram o acompanhamento para uma sopa de lentilha verde temperada com alho e ervas e uma salada simples de tomate, servidos numa noite de ventania descabelante e barulhenta.

1 1/2 xícara de leite integral
Três dentes de alho
1 colher de sopa de alecrim fresco picadinho [*usei o seco]
3 ovos da galinha feliz
1 1/2 xícara de farinha de trigo
1 colher de manteiga derretida
1/4 colher de chá de sal
3 colheres de sopa de queijo parmesão ralado

Aqueça o leite numa panela até ele ficar bem quente. Desligue o fogo e coloque os dentes de alho cortados ao meio e o alecrim de molho no leite quente por pelo menos vinte minutos.

Pré-aqueça o forno em 450ºF / 232ºC. Unte seis formas grandes ou doze pequenas para popover com manteiga. Se não tiver as formas próprias para popover, use as para muffins.

No liquidificador coloque todos os ingredientes, mais o leite coado [descarte o alho e o alecrim]. Bata bem até obter uma massa lisa e coloque nas formas até 2/3 de altura, porque eles crescem e abrem.

Salpique cada popover com um pouquinho de queijo parmesão e leve para assar em forno alto pré-aquecido por 15 minutos. Baixe a temperatura do forno para 325ºF / 162ºC e asse por mais 15 minutos. Não abra a porta do forno durante o processo. Desenforme e sirva, quentinho.

dias de ventania
[descabelante]

Perdi hora pela manhã, o alarme não tocou. Isso acontece raramente, mas quando acontece desestrutura todo o meu dia. Acordar devagar, abrir os olhos com calma, espreguiçar, pensar na morte da bezerra antes de colocar os pés no chão, me desejar um bom dia, tudo isso faz parte da minha rotina matinal, que foi interrompida porque o alarme não tocou ou tocou e eu não ouvi. Me virei ainda semi-imersa num sonho para olhar o relógio e os números que vi me fizeram pular da cama num sobressalto assustado—sete e cinco!

Felizmente deu pra beber minha xícara de café, remoendo a perda dos preciosos minutos. Cara amarrada. Já saindo para a fazenda ele me perguntou—dormiu bem? A resposta era sim, dormi, mas não pude dizer que sim, já que estava amargurada pelo atraso. Mais ou menos, foi a minha resposta mal humorada.

O menu do jantar foi sopa de lentilha verde com alho e ervas. Colocar a receita aqui é chover no molhado, mas eu queria registrar. Começou a ventar horrivelmente. Uma pessoa que conheço, nascida em Upstate New York, sempre bradava num tom apocalíptico que na Califórnia quando chovia, chovia, chovia, chovia, e quando ventava, ventava, ventava, ventava. Eu nunca entendi muito bem essa reclamação exacerbada, mas é verdade que quando venta, realmente venta e venta enlouquecidamente e descabelantemente por vários dias.

Dormi com o barulho dos galhos da árvore chicoteando o telhado da casa. O cachorro do vizinho latia sem parar, chorando. Vento, vento, vento, vento. A manhã chegou gelada e eu perdi hora, perdida no sonho, sonhando com algo que nem mais lembro.

pimentão recheado com arroz

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Usei o arroz jasmine coral já cozido de maneira tradicional e segui o principio da receita de pimentão recheado da tia Dirce, pois acho que aliche/anchova combina muito bem com pimentão. É só cortar os pimentões ao meio—usei verdes, vermelhos e amarelos, já que tinha uma coleção—remover sementes e rechear com a mistura de arroz, cubinhos de pimentão vermelho, filézinhos picadinhos do melhor aliche que seu dinheiro puder comprar, azeitonas pretas picadinhas e salsinha fresca picadinha. Assar em forno médio, até os pimentões ficarem macios. Servir quente ou frio.

Fair Trade

jasmine-coral-rice_1S.jpg jasmine coral rice Quando eu perguntei ao meu amigo que é diretor da fazenda orgânica da UC Davis e uma das pessoas mais engajadas em políticas de agricultura e meio-ambiente que eu conheço, o que mais eu poderia fazer além de comprar local e orgânico de produtores que praticassem a auto-sustentabilidade, ele respondeu na lata—buy Fair Trade!
Ele também me recomendou pesquisar os fazendeiros que adotassem práticas justas com seus trabalhadores, não explorando mão de obra barata e ilegal. Mas o Fair Trade é um detalhe muito importante para os produtos que vem de países mais pobres e em desenvolvimento, pois essa prática econômica tem como um dos seus objetivos principais promover um sistema global de economia sustentável e justa. Morando num país rico que compra produtos de países mais pobres, é minha obrigação tentar não contríbuir com qualquer tipo de exploração. Banana, chocolate, café, açúcar são produtos que têm uma boa distribuição Fair Trade aqui nos EUA. A banana e a quinoa que eu compro são Fair Trade. Há muitos outros produtos nas prateleiras dos supermercados que também são, é só procurar com cuidado. Esse delicioso arroz jasmine coral da Tailândia é Fair Trade. Fique de olho nesses produtos você também!
»Para saber mais, visite o website da Fair Trade Federation.

sopa de abóbora e manjericão

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Relendo depois de vinte anos O Melhor da Festa da Sonia Hirsch, rememorei algumas das suas boas idéias. Uma delas, misturar abóbora com manjericão, que segundo ela é uma das combinações mais perfumadas da história da culinária. Não posso discordar. Usei uma abóbora japonesa, a kabocha, que já estava previamente assada. Eu tenho o costume de assar coisas de véspera ou quando estou usando o forno ou a churrasqueira pra fazer outras coisas. Essa abóbora tem uma casca grossa que não é fácil, precisa ter muito muque para descascá-la e como muque é o que eu não tenho, apenas cortei ao meio, removi as sementes, embrulhei no papel alumínio e assei. Na hora de fazer a sopa, removi toda a polpa com uma colher, coloquei no liquidificador com bastante folhas de manjericão fresco e um tanto de água—ia usar caldo de legumes, mas resolvi que não deveria interferir no sabor da abóbora e do manjericão. Bati bem a mistura. Numa panela refoguei cubinhos micros de cebola no azeite, acrescentei o creme de abóbora, temperei com sal e pimenta branca moída, deixei levantar fervura e desliguei o fogo. Servi a sopa com pedaços de queijo fresco e um fio de azeite super-extra-especial.