cansada, eu?

Passei o final de semana organizando a casa. É aquele ziriguidum que acontece uma ou duas vezes por ano. No sábado eu arrumei tudo o que precisava ser arrumado na parte de baixo da casa. Pilhas de livros na cozinha, uma pilha de papéis pra jogar fora e outra pra guardar, geladeira cheia de produtos com data de validade expirada, gaveta com condimentos que precisavam ir pro lixo. O Uriel me ajudou esvaziando e lavando o que iria ser reciclado. Nosso container de recicláveis nunca ficou tão cheio. E tinha cacarecos mil na lavanderia. Nem cheguei na garagem, pois lá preciso de mais um dia. No domingo me concentrei no closet e armários e gavetas de roupas, depois entrei no mundo encantado de papelada do escritório. Cansei, fiquei mal humorada e com dor nas costas, mas botei ordem no que queria colocar. Segunda-feira na hora do almoço estava trocando as roupas de cama e de banho, trocando também a capa do edredon e dos vários travesseiros que enfeitam a cama. Ainda falta organizar as contas do mês, que eu faço online. Comecei a semana esbagaçada. Como segunda é também o dia da cesta orgânica e o Uriel ligou avisando que iria ter que jantar rapidamente e voltar pro trabalho—o que não é algo inédito na rotina dele, eu fiz o prato coringa que sempre faço quando estou com pressa, quando preciso de um conforto: macarrão ao alho e óleo com bastante salsinha e queijo parmesão ralado na hora. Tive que tristemente reciclar dois maços gigantes de verduras da cesta. Ainda sobrou mais um chard colorido, outra verdura arrocheada, mais uma acelgona, alface e rúcula. Vieram também rabanetes e nabos. Nabos!! Nabos?? For Pete’s sake, onde estão as cenouras??

Monday Monday, [not] so good to me

Não bastasse eu estar soterrada de trabalho há meses, sem tempo para muitas leituras durante o dia, fazendo malabarismos e correrias para poder manter esse Chucrute ativo durante a semana, agora temos a noite chegando às 5 horas e a cesta orgânica abarrotada de folhas verdes. Infelizmente eu preciso dormir oito horas por noite, para poder funcionar e produzir no dia seguinte, senão poderia usar essas horas pra fazer outras trocentas mil coisinhas que eu quero fazer e não consigo.

Segundas são sempre punk pra mim, mas se durante o verão eu pegava a cesta e lavava rapidamente os legumes e frutas, ainda me sobrava tempo e luz para bolar fotos, pensar em receitas. Agora, com a noite chegando tão cedo e a cesta praticamente monocromática, com uma abóbora para destoar do vasto espectro de tonalidades de verde, não é mais a mesma coisa. Fico muito mais cansada e com a impressão de que já é muito mais tarde do que parece.

E como usar esse monte de verde? Chegou outra acelga do tamanho de uma melancia. E mais mações de espinafre, alface, rúcula, boc choi, red russian kale e cebolinhas verdes de tamanho descomunal. Com as sobras da geladeira, que incluiam outros verdes de alho poró e salsão, mais alguns nabos, fiz um caldo. Usei todos os verdes possíveis e ainda sobrou muita coisa. Enquanto fazia o caldo e lavava as mil e uma folhas verdes, coloquei uma abóbora cortada ao meio e sem as sementes para assar no forno—sim, eu tenho mania de assar tudo nessa época do ano.

A abóbora assada virou uma sopa, que ficou realmente boa. Refoguei a parte branca e picada de um alho-poró num pouco de azeite. Quando a abóbora ficou molinha, removi a polpa com uma colher e coloquei no copo do liquidificador, onde bati com um pouco de caldo de legumes—não usei muito, pois quis uma sopa bem cremosa e que não precisasse cozinhar mais. Juntei ao creme de abóbora, uma xícara de um queijo branco cremoso, russian style. Joguei esse creme de abóbora, queijo e caldo de legumes sobre o refogado de alho-poró. Temperei com sal, deixei ferver, desliguei o fogo e servi.

a peste do dia

“This summer has been a tough one for us in the pest department… and not just arthropods and diseases! We continue chasing off wild turkeys (that have decimated our second melon planting and have turned their eyes on our cucumbers!) and setting out have-a-heart traps for the jackrabbits that keep sneaking in under our fence. Aside from these crop-munchers, there is always the odd crow or ground squirrel that decides to chew a hole in our irrigation lines. Alas, this is life on an organic farm, and as a CSA subscriber you can feel good about what both you *and* those little critters are putting in your bodies!”

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perus selvagens, uma das pragas que atacam a horta da minha amiga Alison

A cartinha da cesta orgânica desta semana me fez sorrir nervosamente, pois agora eu sei que as pestes na agricultura abrangem muito mais espécies do que eu podia imaginar. Pra falar a verdade, antes de eu ter uma horta eu nem pensava em pestes ou se pensava era uma concepção tão remota, só de ouvir falar, naquele papo dos horríveis agrotóxicos. Mas eu lembro de sempre dizer com muita determinação e empáfia que eu preferia as minhas verduras com furos ou presença física de bichos [escrotos] do que pulverizada por químicos e venenos. Mas na verdade eu nunca tinha tido muito contato com as pragas e outros miserês agrícolas até então. Claro que os bichos que chegavam com os legumes e verduras da cesta assustavam, mas não me davam raiva. Ter uma praga destruindo a sua horta dá raiva e dá vontade de aniquilar tudo sem dó, rápido e de qualquer jeito—com spray desintegrante, veneno cancerigeno, pó fumegante, bomba de gás, maçarico flamejante, energia nuclear. Foi isso que eu senti quando vi o meu quintal todo esburacado por um gopher no final de um inverno. Fui atrás de uma solução e fui instruída por experts a comprar umas bombas de gás e enterrá-las acesas dentro dos túneis cavocados pelos gophers. Comprei os tubinhos mortíferos movida pelo ódio, mas não tive coragem de implementar o plano assassino. Não sei que fim teve o gopher de olhinhos sapecas. Se ele morreu, foi por qualquer outro motivo alheio à minha vontade. Praga de pensamento cármico, talvez, mas minhas mãos não se sujaram com sangue inocente e minha consciência está tranquila.

Meu trabalho no IPM também contribuiu muito para me abrir os olhos, não só para a quantidade quase incomensurável de pragas nojentas dos mais diversos tipos, mas também para as pragas fofinhas. Não são somente vermes, insetos, ácaros, cracas, doenças, pulgões, lesmas, ratazanas, aracnídeos, répteis rastejantes e ervas daninhas de diferentes procedências, que atacam como uma invasão enlouquecida de entidades devoradoras as nossas frutas, legumes e verduras. Há também o esquadrão das pragas bonitinhas. A descoberta de que coelhinhos, passarinhos, esquilinhos, veadinhos e outros bichinhos fofos podem ser realmente do mal foi um grande choque.

Ainda é muito duro pra mim encarar esses bichos realmente bonitos como inimigos. Mas já estou me acostumando a olhar aquela fauna de filme da Disney com olhos mais suspeitos e tenho certeza absoluta que não quero a visita de um esquilo ou de um coelhinho no meu quintal.

usando o forno solar

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No verão passado eles me prepararam um banquete no forno solar. Neste ano combinamos um chá da tarde, para eu poder provar um delicioso nectarine cobbler assado no calor do sol. Os fornos solares estão ficando muito populares e são incrivelmente eficientes. Eu tinha planejado comprar um, mas me resignei quando percebi que meu quintal tem muita sombra das árvores e que eu precisaria de uma persistência de maratonista para conseguir cozinhar nele. Mas meus amigos moram num sítio e têm espaço ensolarado abundante, o que propicia um prolifico uso dessa engenhoca genial. O forno atige a temperatura de 400ºF/205ºC e cozinha mesmo! Com os verões tórridos que temos por aqui, é legal poder aproveitar esse calor natural e economizar gás e eletricidade. O cobbler ficou delicioso. Devoramos acompanhado de um sorvete de nectarinas que eu levei e uma caneca de chá.

tira o leite da vaquinha

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Quando vamos para Point Reyes passamos por inúmeras fazendas leiteiras, que transformam a região numa imensa paisagem de comercial de televisão, com pastos verdinhos, cerquinhas, vaquinhas faceiras e se você der sorte, como nós demos, bandos de cervos correndo pelos morros. Dá vontade de parar para tomar um copo de leite, mesmo eu não sendo fã número um desse produto.
Na minha decisão juramentada de consumir produtos locais, estou fazendo algumas mudanças. Eu tenho a sorte de viver num dos estados com a maior e mais variada produção de alimentos do país, então não está sendo muito difícil acomodar os produtos locais. Eu já era compradora do iogurte estilo europeu e da manteiga dessa fazenda orgânica, e agora estou começando a comprar todos os seus outros produtos. As garrafas de leite e creme são recicláveis e refundáveis, você leva de volta pro supermercado e recebe umas patacas de volta.

be a local hero

Jantávamos no quintal à noite, com uma brisa fresquinha soprando, as luzinhas do arraial acesas e admirávamos nossa árvore de nectarinas tão apinhada de frutas que envergou e tivemos que colocar dois suportes de madeira para que o galho não se quebrassem. Essa visão do nosso quintal com grilos cricando, luz de vela de citronela, céu salpicado de estrelas e comida fresca, boa e saudável na mesa é a nossa realidade, mas não é a realidade do mundo.

Posso parecer um pouco panfletária quando comento repetidamente minhas reflexões sobre alimentação, mas ando incrívelmente assustada, pessimista e desiludida, especialmente quando leio uma notícia abismante como esta. Cheia de pesar e incredulidade fico conjecturando onde vamos parar. Se a situação já está desanimadora hoje, imaginem o que estaremos comendo em alguns anos ou décadas?

Quando leio essas notícias horrorosas, tento avaliar a extensão do estrago causado pelos nossos maus hábitos de alimentação, quando a comida parece ser apenas um enche-bucho irracional e que ainda traz de brinde uma sentença de vida miserável e de morte lenta e sofrida. A solução mais simples e efetiva que me ocorre no momento é diminuir meu raio de visão e me concentrar no espaço onde eu vivo, que se resume à minha casa, minha vizinhança, minha cidade e se estendendo um pouco, pelo meu estado. Comer comida local, que já é um slogan bem divulgado por muitos movimentos de resgate da nossa alimentação. Com certeza teremos menos problemas, e mais soluções viáveis e ao nosso alcançe se tivermos problemas, se a nossa comida vier da região onde vivemos. Não dá pra evitar cem por cento os produtos industrializados, mas pelo menos podemos fazer uma opção nas frutas, verduras, legumes, carnes, ovos, pão, leite, queijo. Quando peguei as amoras das mãos manchadas pelo sumo roxo do fazendeiro que as plantou, colheu e agora as está vendendo, sinto um alívio imenso. As amoras doces não tem gosto de papelão imerso em essência de fruta. São reais e me dão um bocado de esperança, que podemos comer como gente, se essa for a nossa vontade.

Asheville , 10 — China, 0

Fiquei totalmente horrorizada lendo essa reportagem do New York Times sobre o fechamento de um monte de fábricas de alimentos na China. A história toda começou a vir à tona, quando animais começaram a morrer aqui nos EUA contaminados com uma comida produzida no Canadá com matéria prima vinda da China. Eu evito o máximo que posso comprar produtos made in china, mas está ficando cada vez mais difícil, pois parece que o mercado norte-americano está totalmente dominado pelos chineses. É um choque ver uma cultura tão rica ser totalmente corrompida pela sede de lucro e poder. Eu estou sempre ouvindo que em breve a China será a maior potência mundial, superando os EUA. Quando isso acontecer eu espero estar morta.
Mas nem tudo são horrores neste mundo. E existe sim a possibilidade de uma economia sustentável, sem sweatshops, salários micros, exploração, e política desonesta. A Kate Hopkins do Accidental Hedonist publicou essa história muito legal dessa cidadezinha e depois publicou mais um artigo argumentando uma critica. Vale a pena ler os dois textos dela e descobrir que há muita gente repensando os velhos e carcomidos modelos de economia capitalista, que visivelmente não são os caminhos que vão nos levar a construir um mundo melhor.

dias assim são assim mesmo

Não é que a comida ficou ruim ou incomível. Ela só não ficou maravilhosa, e nem deve ter sido erro de receita ou má escolha dos ingredientes, mas sim efeito moral de final de segunda-feira agitada e cansativa, regada com um pinguinho de mau humor. Fui fazer o jantar usando uma estratégia impraticável para uma pessoa sozinha—usar o forno na cozinha e a churrasqueira lá no fundo do quintal ao mesmo tempo. E fui falar ao telefone, fui lavar os legumes e verduras da cesta orgânica, além de organizar os ingredientes pras receitas. Assim é querer demais, não? No interim o garbage disposer entupiu com alguma coisa e uma das bacias da pia ficou inusável, com aquela água suja boiando. Mesmo assim consegui terminar tudo, sem queimar nada e servi o jantar na mesa do quintal, como sempre—com tudo arrumado, pratos, copos bonitinhos, guardanapos de pano. Mas não rolou aquele excitamento de receita nova feita com ingredientes frescos. O clima do jantar foi de vamos apenas forrar o bucho. Nem as fotos que tirei prestaram. Dias assim acontecem e são assim mesmo, fazer o quê?

Salada de abobrinha grelhada
Cortei duas abobrinhas amarelas grandes em fatias grossas e temperei com sal marinho grosso, pimenta do reino, sálvia seca e azeite. Coloquei na churrasqueira em fogo baixo—pode ser feita na grelha. Grelhei dos dois lados, coloquei numa vasilha, deixei esfriar e salpiquei com cebouletes picadinha e cubinhos de queijo feta. Servi com um molhinho feito com duas partes de iogurte natural, uma parte de maionese, azeite, suco de limão e sal, tudo muito bem emulsificado pelo batedor de arame.

Tabuli de tomate assado
Ponha o trigo de quibe de molho na água—uma xícara de trigo, uma xícara de água. Deixe absorver toda a água. Mexa com um garfo. Acrescente bastante hortelã, manjericão e salsinha picados. Asse uns tomates no forno, temperados com sal, pimenta, azeite. Deixe esfriar e misture no trigo com as ervas. Tempere com sal, pimenta, azeite e suco de limão a gosto. Sirva.