Mês: novembro 2008
Prevention of Farm Animal Cruelty Act
uma sopa para Barack
Fomos votar bem cedinho e depois eu fiquei em casa descansando, pois não estava me sentindo muito bem. Talvez tenha sido um vírus de gripe ou apenas o acúmulo de tensão que eu senti nas últimas semanas—pessimista que sou—pensando na possibilidade do Obama não vencer a eleição.
Fomos acompanhar os resultados na casa de uma amiga. A Alison preparou uma deliciosa sopa de cebola, receita da Julia Child e uma salada refrescante com farro e romã. Chegamos lá às 7 da noite e os convidados estavam todos muito felizes e otimistas com as projeções dos resultados. Tomamos a sopa, que ficou deliciosa e comentávamos cada mudança. O Allan coloria o mapa dos EUA conforme o noticiário ia dando as projeções. Às 8 horas, quando as urnas da Califórnia e dos outros estados do extremo oeste fecharam, um dos comentaristas da rede de televisão ABC simplesmente anunciou—o novo Presidente eleito, Barack Obama! Dali em diante foi uma enxurrada. Abrimos champagne, choramos, foi uma noite emocionante que não vou esquecer nunca. Essa vai ser a história que vou contar para meus netinhos e bisnetinhos—eu votei nele, eu vi ele ganhar de lavada, eu chorei de alegria e alívio naquela noite memorável e histórica!
Barack Obama me conquistou mesmo antes de eu não poder votar neste meu país adotado. Quando ele falou da América dele, eu me identifiquei, porque a América de Barack Obama é também a MINHA América. Ontem finalmente cruzamos a fronteira, demos um passo em direção à um futuro diferente e melhor. Saímos da escuridão. Daqui pra frente tudo será diferente.
Para fazer a sopa de cebola, a Alison usou um caldo de carne que eu preparei antecipadamente. Também usei uma receita da Julia Child.
Brown Stock
[adaptado do Mastering the Art of French Cooking, Julia Child et al, Volume I.]
Faz 4 litros
2 quilos de carne — a Julia recomenda usar ossos e pedaços de carne, então eu sei uma carne barata, chamada shank, com carne, gordura e osso com tutano
2 cenouras em cubos
2 cebolas em pedaço
2 talos de aipo em pedaço
1 nabo cortado em pedaços
1/4 colher de chá de tomilho seco
1 folha de louro
um ramo de salsinha
4 dentes de alho
Num refratário, asse a carne com a cebola, nabo e a cenoura num forno pré-aquecido em 450ºF/ 232ºC por 40 minutos, virando a carne e os legumes no meio tempo. Coloque a carne e os legumes numa panela grande, coloque todos os outros ingredientes e cubra com água. Adicione água no refratário e deixe dissolver, junte essa água com os sabores da carne na panela. Cozinhe em fogo baixo por pelo menos 5 horas. Vá adicionando mais água. Se formar espuma, vá retirando. Depois de frio, coe bem, guarde na geladeira e use para fazer sopa.
o meu voto hoje
The Slanted Door
A Mariana foi ao The Slanted Door e não só tinha me recomendado, como tinha me intimado a ir também. Então eu fui! A Maryanne fez a reserva para o domingo e nos encontramos lá para o almoço—eu, o Uriel, ela e o Paulo. O restaurante fica num dos meus lugares favoritos em San Francisco, o Ferry Building Marketplace, que era o antigo porto da cidade hoje transformado num espaço gastronômico fantástico.
The Slanted Door oferece delicias da culinária vietnamita com um toque moderno e coloca uma grande ênfase na qualidade dos ingredientes usados na elaboração dos pratos. Eles usam produtos orgânicos e fresquíssimos vindos de produtores da região da Bay Area que praticam agricultura sustentável. Administrado pela família Phan desde a sua inauguração em 1995, o restaurante tem um ambiente descontraído, num espaço enorme e cheio de luminosidade, com paredes de vidro que emolduram uma das paisagens cartão postal mais lindas da baia, com a Bay Bridge ao fundo.
Nossa reserva era para as 2 horas da tarde, o que somado à mudança de horário [saimos do daylight saving times] me colocou num estado de fome alucinante. Um dos problemas do The Slanted Door foi, para uma libriana típica como eu, o menu incrívelmente extenso. Fiquei numa dificuldade lancinante para decidir o que pedir. A carta de vinhos era basicamente francesa, o que me colocou numa outra enrascada, já que eu estou ficando com prática de escolher vinhos californianos, mas saiu da minha pequena bolha eu já fico atrapalhada. No final pedi um bourgogne pinot noir rosé francês que estava bem leve. A Maryanne pediu um pinot noir de Oregon que ela gostou bastante também.
Quando finalmente decidimos sobre os pratos, a garçonete gentilmente nos avisou que tínhamos pedido muita comida. Realmente as porções servidas lá são bem generosas. Então decidimos enxugar nossa lista de entradas. A Maryanne e o Paulo pediram os famosos rolinhos frios vietnamitas, com camarão e molhinho de amendoim. Depois ele comeu um frango com capim-santo e ela um prato bem picante de berinjela japonesa, que eu provei e estava uma delícia. Eu e o Uriel dividimos uma salada muito refrescante de papaya verde e tofu e depois ele comeu um halibut do Alaska com um molho picante de gengibre e eu comi um catfish cozido no pote de barro com coentro e gengibre. As porções eram grande e acompanhamos tudo com arroz jasmine. Só eu—a esfomeada e gulosa—que pedi sobremesa, um doce de abóbora kabocha com um creme de menta e sementes de romã, que apesar de parecer uma combinação um pouco estranha, funcionou muitíssimo bem.
Saímos do restaurante super tarde, quando quase todos os funcionários já estavam comendo nas mesas do fundo e o local se preparava para o inicio dos serviços do jantar. Adorei a experiência no The Slanted Door e recomendo. Para nós, que vivemos aqui na Califórnia, os sabores asiáticos não são nenhuma novidade, nem nada muito exótico, já que temos um restaurante desses em cada esquina. Mas nem todos com a qualidade do The Slanted Door, onde o que importa não é somente a comida e o quanto se paga por ela, mas também toda a política que envolve comer bem, com qualidade, apoiando a agricultura local e sustentável e a criação de animais sem crueldade.
* A Maryanne dá mais detalhes sobre o restaurante. Não deixe de ler a review dela lá no Hotel California.
brevidades
Seria possível uma receita com três ingredientes fracassar? Para a maioria dos habilidosos fazedores de bolos e bolinhos não seria, mas comigo, vocês já sabem que seria. Fui fazer a receita de brevidade da Neide, que por ser da Neide já garante que não vai haver problemas. Mas eu não contava com o detalhe de que certos ingredientes fazem a diferença, e neste caso eu não tinha o açúcar certo.
Eu não compro nem uso o açúcar branco, daquele comum que se usa normalmente para cozinhar. Compro quatro tipos diferentes de açúcar, todos orgânicos e Fair Trade—o demerara, o mascavo, o sucanat-rapadura e o de confeiteiro. O demerara eu mantenho baunilhado, colocando no pote todos os bagaços das favas de baunilha que usei para fazer outras receitas. Uso esse açúcar para quase tudo, inclusive para bolos e muffins.
Tentei fazer a receita da brevidade duas vezes usando o açúcar de confeiteiro. Falhei miseravelmente, desperdiçando duas claras de ovos da Felizberta. Resolvi tentar com o demerara baunilhado e até que deu certo, mas não rendeu nem cresceu muito. A Neide diz que a receita faz 16 forminhas de empada. A minha fez 12 mini muffins. Ficou bem gostoso, derretendo na boca como é típico da brevidade, mas poderia ter ficado melhor. Eu imagino que a quantidade de açúcar deveria mudar se usarmos um açúcar mais leve [confeiteiro] ou mais pesado [demerara]. Mas como não sei fazer esse tipo de ajuste, vou me resignar e sair pra comprar um pacote de açúcar branco comum, para poder refazer essa deliciosa e simples receita.
brevidades de araruta ou polvilho doce
1 ovo caipira
65 g* de açúcar
65 g* de araruta ou polvilho **
Manteiga para untar as forminhas
Unte com manteiga 16 forminhas de empadinha pequenas [se usar de silicone, unte também]. Na batedeira, bata a clara em neve. Junte o açúcar e bata como suspiro. Acrescente a gema e bata até ficar um creme esbranquiçado. Desligue a batedeira, coloque a araruta e bata mais até formar bolhas. Divida entre as forminhas só até metade da altura e leve para assar por cerca de meia hora em forno pré-aquecido em 430ºF/ 220ºC, ou até ficar com a superfície dourada.
Faz 16 brevidades
* o ideal é pesar o açúcar e a araruta, mas se não tiver balança, use uma colher padronizada rasada: 8 colheres de sopa de araruta e 5 colheres sopa de açúcar.
** eu usei a tapioca starch.
em cores vibrantes
três
Em primeiro de novembro de 2005 às 11:22:40 da manhã nascia o Chucrute com Salsicha, com seu primeiríssimo post de inauguração. Com certeza eu tinha passado o dia anterior sentada por horas e horas e horas na cadeira do meu pequeno escritório montando o blog, ajeitando o layout, colocando tudo em ordem para iniciar a função de blogar sobre comida, que desde então nunca parou.
E hoje o Chucrute completa três anos de postagens diárias, com muitas fotos, muitas receitas e, principalmente, muitas histórias. Milhares de pessoas passam por aqui todos os dias e isso coloca um certo peso nos meus ombros, que eu tenho tentado carregar com o máximo de firmeza e elegância.
O Chucrute com Salsicha é um espaço muito especial para mim porque ele reflete um bocado de quem eu sou. Os assuntos aqui são sempre muito variados, os papos seguem as estações do ano e vão pipocando conforme as idéias e as oportunidades vão surgindo. Eu não tenho nenhum esquema planejado ou um sistema de organização para blogar. Não me empenho em pesquisas, não sigo modismos, nem endosso produtos ou pessoas que eu não conheço direito ou não confio. Não tenho pretensão de fama ou grana, só escrevo sobre o que eu gosto e sobre o que me interessa, por isso não promovo ou participo de eventos coletivos. Eu faço a minha pauta, de um jeitão idiossincrático que é só meu. Não me inspiro no estilo de blogar nem nas idéias de ninguém. O Chucrute sempre foi um espaço original e autêntico, influenciado apenas pelas minhas convicções, pela maneira com que eu encaro a vida, pelas minhas opções, aspirações e realizações.
Defendo com insistência quixotesca a propriedade das minhas fotos, pois elas são a expressão da minha visão do mundo—desde a amplitude das paisagens das vinícolas californianas até os micro detalhes de uma flor se abrindo ou de uma lagarta morando num pé de tomate. Sem essas imagens o Chucrute com Salsicha não estaria completo. E a minha escrita, com todas as costumazes mancadas ortográficas e a abundância de expressões peculiares, é parte da minha personalidade, uma extensão do meu papo firme na vida real. Eu gosto de escrever, de fotografar e de comentar qualquer tipo de assunto relativo à culinária—um pouco mais do que gosto de cozinhar e comer. Por isso não considero o Chucrute com Salsicha apenas um blog de receitas. Ele é sim um blog sobre comida, e também sobre bebidas, música, cinema, política, livros, amor, prazer, felicidade e vida!