Uma das coisas mais gostosas da vida é dividir a cozinha com alguém que você ama, fazer o rango juntos, ou apenas colaborar. Meu marido não cozinha, mas esse pequeno detalhe não impede que dancemos juntos um Blues culinário. Normalmente a tarefa fica dividida entre eu cozinhar e ele limpar. Quando terminamos de jantar, ele coloca a louça na máquina de lavar, esfrega as panelas e outros objetos que eu não gosto que coloque na máquina. Quando estou exausta, depois de um dia de trabalho, bicicletagem, cozinhação e comilança, só pensando em subir para o meu quarto, tomar um banho e me enfiar na cama, a visão dele na frente da pia todo compenetrado e deixando tudo arrumadinho me dá uma grande sensação de conforto. Quando temos festa é a mesma coisa, os preparos ficam todos por minha conta, a limpeza é toda dele. Essa é a nossa colaboração, já que ele não é nem de longe um cozinheiro. Essa minha relação na cozinha com o Uriel me faz pensar no Paul e na Julia Child, quando ela começou o seu programa na tevê pública com um orçamento mísero, e ele lavava a sujeirada que ela fazia durante a gravação numa bacia improvisada, agachado no chão. Amor maior que esse não há!
Coloquei umas batatas gigantes pra assar e quando o Uriel chegou dizendo que iria jantar e voltar pro trabalho, avisei que o rango iria demorar. Admito que sou meio possessiva e territorial quando estou na minha cozinha. Quero controlar tudo, fazer tudo, e tudo tem que estar do meu jeito, que é o jeito que eu gosto. Ele sempre oferece ajuda e eu sempre recuso, argumentando que a melhor ajuda que ele poderia me dar é sair da frente e tentar não atrapalhar. Mas como a situação estava meio caótica, sugeri que ele lavasse a alface que já estava de molho na água. Enquanto eu desmembrava a couve-flor em raminhos, cortava a cenoura e os aspargos para cozinhar tudo em etapas no vapor e fazer uma salada, ele começou o processo de lavar a alface. Foi realmente um processo, pois ele desinfetou folha por folha, esfregando cada uma como se estivesse lavando uma peça de roupa. Removeu cuidadosamente duas lesmas e também lavou os ramos de alho verde, as cebolinhas, o alho poró e um macinho de espinafre. No final do processo de lavação, a salada já estava pronta, a batata ainda não estava assada e a pia da cozinha estava uma catástrofe, além de água respingada pelo chão e tapetes. Eu reclamei, mas não muito, pois valorizo cada minuto dessas poucas horas que passamos juntos, colaborando na cozinha, esperando nossa batata assar, conversando sobre o dia, sobre as pequenas e grandes coisas das nossas vidas.