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Eu sou cliente que dá preferência. Gosto de comprar de certos produtores no Farmers Market. Compro sempre os ovos de uma família simpática—e quando quero ovos tenho que ir cedo, porque eles vendem rapidíssimo. Gosto do casal japonês que vende folhas verdes pra saladas, e do japonês dos cogumelos, também volto sempre no moço engraçado das frutas, e na família onde o guri faz as contas todo atrapalhado. Compro as flores sempre do mesmo casal, que já me conhece e eu e ela sempre trocamos uma prosa. Curto comprar com a bonitona do azeite, a alemã dos pães, com as mocinhas da Capay, e com a sorridente cunhada da Deborah Madison, que vende as melhores geléias. E tenho a maior simpatia por um casal de senhores, onde eu compro tomates, nozes e figos, além dessa senhorazinha que vende as frutas menos bonitas, mas eu gosto de tudo que compro dela, e gosto especialmente dela, por uma razão vingativa. Tudo porque uma vez vi ela dando a maior bronca num fulano boçal que estava apertando as frutas. Grr, como eu odeio essa gente que aperta todas as frutas, escolhe, escolhe, escolhe, escolhe, escolhe, abre as espigas de milho, provam tudo e às vezes viram as costas e não compram nada, grrgrrr! E nesse dia ela falou por mim, falou o que eu gostaria de eu mesma ter falado—NÃO APERTE AS FRUTAS PORQUE ELAS ESTÃO MADURAS E SÃO MUITO DELICADAS, NÃO PRECISA APERTAR! O fulano fez uma cara de pateta ofendido e foi embora sem comprar. A senhorinha nem pestanejou com remorso. Melhor perder um possível cliente, do que aguentar aquela tortura de olhar esses tipos machucando as frutas. Bom, eu aprovei o que ela fez, gosto muito dela e pronto. Por isso no sábado fiquei feliz em revê-la no mercado, pois ela sumiu por umas semanas. Reapareceu vendendo uns deliciosos pêssegos amarelos, que são os meus favoritos. Comprei muitos, sem apertar nenhum, e com eles fiz um sorvete.
Estava descascando os pêssegos quando o Uriel apareceu na cozinha para xeretar e quando eu disse o que ele estava fazendo, ele sugeriu que eu acrescentasse um restinho das blackberries que salvaram-se da nossa trogloditice rústica, que nos fez devorar as frutinhas puras, sem creme, nem açúcar. Decidi abraçar a idéia dele e joguei lá umas dez blackberries, junto com uns seis pêssegos bem maduros descascados, mais 1/2 xícara de leite integral e 1 xícara de creme de leite fresco. Juntei mel a gosto e uma colher de sopa de licor de cassis, bati tudo no liquidificador e depois joguei na sorveteira. Sempre tenho o cuidado de ver que o liquidificador não transforme tudo num purê homogêneo, para deixar o sorvete cheio de surpresas pedaçudas. No teste de textura e sabor o crítico me deu um high five enquanto divulgava seu veredito extremamente positivo. As blackberries não foram suficientes para apagar o sabor intenso do pêssego, mas elas deram uma cor lindíssima ao sorvete.