Toda vez que eu ia ao Co-op ou ao Nugget comprar meu leitinho orgânico, via na prateleira as garrafinhas do raw milk–leite cru. O Gabriel já tinha me contado que um casal amigo dele só comprava esse leite, mas eu não fiquei muito interessada, pois estava bem claro que se eu comprasse esse leite, teria que fervê-lo. Mas quando eu li a reportagem do New York Times [Should This Milk Be Legal? infelizmente já fechada], comentando o frenesi do leite cru aqui nos EUA, fiquei com as minhocas de experimentá-lo. A reportagem do jornal explica que esse leite, não pausterizado, é proibido de ser vendido em quase todos os estados do país. A Califórnia é uma das exceções. Mas o pessoal dos estados onde a venda desse leite é proíbida, fazem das tripas coraçào para conseguir o leite clandestinamente, direto de alguma fazenda, sem comprar, mas fazendo trocas, para não infringir as leis. O debate é até onde vale a pena o risco de contrair salmonela, e.coli ou listeria, ficar doente e morrer ou ficar com gravíssimas sequelas, só pelo prazer de beber um leite mais saboroso, que contém umas enzimas a mais que o leite pausterizado.
Quando eu cheguei do supermercado com a garrafa de raw milk na cesta, o Uriel despirocou. Entrou correndo na internet e achou um pdf do USDA [Departamento de Agrícultura dos EUA] e me mandou ler o artigo com título em letras garrafais: The Dangers of Raw Milk. Eu até que tinha pensado em dar um golinho no leite, só pra ver se era assim tão mais saboroso. Mas com todo aquele escândalo perpetrado pelo meu marido, amarelei e FERVI o leite.
O leite que eu fervi, com uma nata grossona boiando na superfície, me lembrou a minha infância, quando o leiteiro entregava o leite em casa, vindo numa carroça e colocando o leite do galão de metal na jarra. Todo santo dia se fervia o leite e guardava-se as natas para depois fazer biscoitinho com ela. Eu não guardei a nata, pois não sei se vou me tornar freguesa desse leite que precisa ferver.