Mês: outubro 2006
love is a many splendored thing
Ele espremeu o envelopinho de maionese e com o fio de creme amarelo pálido escreveu o meu nome no prato – FER.
cooking for one
Finalmente acabou a colheita da azeitona e do pistacho, e meu marido volta para Davis e para suas atividades normais – que não exclui correria, mas pelo menos é por aqui! Foram algumas semanas de omeletes, saladas, sanduíche de queijo com tomate, macarrão e outras improvisações. Eu não tenho motivação para cozinhar só para mim. Ontem fui pintar minha cabeleira mariabetânica descabelada, que estava lindamente multicolorida. Fiquei no salão, lendo revistas da Oprah até tarde. Saí de lá com tanta fome! Já tinha me decidido parar num restaurante no caminho de casa – eu faço tudo à pé aqui em downtown, mas depois que me vi no espelho com uma kanekalon NEGRA, parecendo um corvo corcunda gigante, resolvi só passar no lugar das saladas e pegar uma to-go. Mas da esquina já vi a fila dentro do lugar e desanimei total. Corri pra casa e preparei o famigerado alho e óleo com uma massa integral, e temperei uma salada de rúcula com tomates secos. Um copo de vinho e voalá – melhor do que qualquer restaurante. Mas com a volta do Uriel, vou poder retomar às minhas excursões culinárias, sem falar que ele está trazendo da fazenda uma tonelada de azeitonas fresquinhas, e já falou – procura uma receita para prepará-las. Azeitonas verders virgens, alguém sabe como processar as ditas?
um camarão frito de bar
A Raquel fez a pergunta que não quer calar — o que você comeu na sua lua de mel?
Bom, minha memória é péssima, e já são quase vinte e cinco anos, então não lembro muito bem que comi na minha lua de mel em Ilha Bela. Quer dizer, lembro que bebi o café com leite com mosca no hotel, e que voltei muitas vezes num tipo de um boteco, desses onde a frente da casa tinha sido transformada num bar onde o marido servia as pingas e cervejas, enquanto a esposa preparava uns aperitivos comestíveis. Não lembro como fomos parar lá, mas comi um camarão frito que nunca me esqueci, possívelmente temperado com alho e pimentão vermelho. Uma coisa maravilhosa! E porque na minha lua de mel eu estava grávida de seis meses, aquele camarão virou uma obsessão e eu só pensava e só queria comer aquilo! Tentei reproduzir o tal camarão em casa por anos, mas nunca consegui.
apple
eu, a fer e o bob
Ele vem sempre em outubro, e eu considero isso um presente. Sou fã dele desde que eu tinha uns quinze anos e nem entendia o que ele cantava. Sempre detestei línguas e digo pra quem quiser ouvir que uma das minhas motivações para aprender o inglês foi para entender o que Bob Dylan cantava. Sou uma mulher realizada! Hoje vou vê-lo em Sacramento, pela quinta vez. Só que vai ser um pouco diferente, pois o Uriel não vai comigo. Ele está na fazenda e eu convidei uma amiga para ir ao show comigo. Eu e o Uriel temos muitas histórias com o Dylan. Apesar de que eu já era uma fanzoca do Mr. Zimmerman antes de conhecê-lo, foi com ele que vi o Dylan pela primeira vez, sem contar que considero o meu marido my private Bob Dylan. Ele detesta quando eu falo isso, mas eu tinha essa foto do Dylan colada na parede do meu quarto, e um dia olhei pra ela e tive uma luz—eu conheço esse cara! Era o Uriel! Ele nega, recusa, abomina, rejeita. Eu acho que minha vida não seria a mesma sem os meus dois Bobs. Hoje vou sentir falta dele falando as coisas engraçadas, tentando me distrair, demonstrando ciúmes de um cara completamente inatingível e que não tem a menor idéia que eu existo. A melhor história que tenho com o Uriel e o Bob foi na nossa lua de mel. Fomos pra Ilha Bela com a Caravan do meu pai—éramos dois pirralhos e estudantes pobres—e eu levei todos os meus k7s do Dylan, que tocaram sem parar no tape do carro. Na volta, um amigo do Uriel fez uma pergunta bem cretina—e ai, Uriel, como foi a Lua de Mel? E ele respondeu prontamente—ah, foi ótima, eu, a Fer e o Bob!
to cook trout
Uma receita do Pepys at Table, que eu ainda não fiz, mas vou com certeza fazer e quero deixá-la aqui como referência – porque logo vou ter que devolver o livro para a biblioteca. Uma receita do século 17 adaptada para os nossos tempos.
4 trutas fescas e limpas
Um raminho de cada: alecrim, folhas de erva doce, salsinha e manjericão
300 ml de água
Uma pitada de sal
4 fatias de laranja
25 gr de passas currant
25 gr de manteiga
25 gr de farelo de pão integral
Uma pitada generosa de canela
Suco de 2 laranjas
Um maço de agrião
Recheie os peixes com as ervas. Coloque-os numa panela rasa com tampa. Adicione a água, o sal, as fatias de laranja, cubra e leve ao fogo baixo, deixando ferver e então cozinhando devagar por mais ou menos 10 minutos, até os peixes ficarem cozido. Remova os peixes, reserve o liquido. Retire as peles e fatie. Reserve as ervas do recheio. Coloque os peixes numa forma aquecida. Derreta a manteiga numa frigideira. Misture as passas, o farelo de pão e a canela e adicione à manteiga derretida, refogando levemente por uns minutos. Adicione as ervas cozidas, o suco de laranja e metade do liquido do cozimento dos peixes. Cozinhe por uns minutos, salgue a gosto. Sirva os peixes acompanhados do agrião e do molho, que deve ser servido numa vasilha separada.
o cheiro das coisas
Todo mundo sabe como funciona e tem uma história pra contar com relação a essa memória do olfato. Aquela que nos faz relembrar de coisas, pessoas, reviver momentos, nos remete num flash a algum outro lugar ou tempo, nos faz viajar na lembrança. Hoje eu vivi um episódio desses, ao sair do banheiro do Robbins Hall. Uma estudante estava num nicho no corredor, onde ficam uma mesa, cadeiras, sofás, uma máquina de xerox e uma estante com panfletos e livretos. Ela falava no celular numa língua asiática, sentada à mesa, onde repousava o resto do seu almoço: uma dessas vasilhas enormes de isopor, onde se joga água quente e faz uma sopa de noodles. Passei por ela e imediatamente senti um cheiro de comida. Era um cheiro familiar e particular, um cheiro que me teletransportou para um outro prédio acadêmico, num outro país, por onde eu também passava frequentemente. Meus olhos se encheram de lágrimas e eu fiquei uns segundos tomada por aquela sensação calorosa da lembrança. Aquele era o cheiro da cafeteria que tinha num dos andares do suntuoso prédio da Agricultura da Universidade de Saskatchewan. Um prédio todo de vidro, estrutura moderna, que custou não sei quantos milhões de patacas canadenses, e que tinha o mesmo cheiro da sopa de noodles da estudante da Universidade da Califórnia – desses no recipiente de isopor, que se compra em qualquer supermercado por uns meros mirréis.
Pepys at Table
Samuel Pepys foi um oficial da marinha inglesa que viveu no século 17, quando manteve um diário. Os escritos se iniciam em 1660, quando Pepys tinha 26 anos, e terminam em 1669, um pouco antes da morte da sua esposa, Elizabeth, com apenas 29 anos. Mas graças à esses anos em que Pepys manteve o seu diário, que pudemos saber muita coisa sobre a vida cotidiana dessa era. E especialmente sobre os hábitos alimentares, que foram compilados neste livro publicado pela University of California Press. As receitas tiveram que ser adaptadas para os dias de hoje, e os autores Christopher Driver e Michelle Berriedale-Johnson explicam os por ques. A comida em si mudou, pois em 1660 não havia refrigeração, e tudo era extremamente seazonal. Mudaram também os utensilios e utilitários domésticos, as cozinhas, os cozinheiros e os comensais. Só não mudou o prazer pela gastrônomia, que evoluiu e se sofisticou.
Pepys at Table contém inúmeras explicações, intercaladas por trechos do diário, a receita original e a sua adaptação para o século 20 – quando o livro foi escrito e publicado. Um livrinho pequeno, mas que me proporcionou uma grande viagem no tempo.
morning snack
Meu café da manhã é paupérrimo. Acordo num mau humor desgranhento e não tenho o menor apetite. Bebo apenas uma xícara de café com leite morno, às vezes mordisco uma bolacha, um pedacinho de pão. Duas horas depois estou acordada, menos mal humorada e faminta! Por isso trago uma lancheira pro trabalho. É pela manhã que necessito desse ranguinho extra. Procuro caprichar, com frutas, cereais, algo com leite. Bebo água ou chá o dia todo. Acho que posso dizer que tenho mais hábitos alimentares saudáveis do que não saudáveis. Ou tento ter!
Na minha lunchbox de hoje:
—uma banana nanica orgânica, com selo de certificação de FAIRTRADE [adoro isso!]
—um saquinho com damascos secos do Farmers Market – eles são cor de laranja escuro e não amarelo como os de supermercado e têm um sabor inigualável.
—uma barra de cereal de limão com cranberry – essas nunca faltam na minha lancheira.
—um potinho com iogurte de leite de cabra [é booom!] adoçado com uma geléia de figo e açafrão, que comprei no Farmers Market, e que é o fino da bossa!
—crackers integrais da Dr. Kracker com queijo e sementes de abóbora – essas bolachas são simplesmente o máximo, sou viciada nelas!