Enquanto limpo o banheiro dos gatos reflito sobre a importância de uma areia de boa qualidade para cristalizar bem os xixis, encroquetar bem os cocôs, manter o cheiro suportável e deixar o meu trabalho mais fácil. Com a pá que também é peneira, vou cavocando a areia cheia de granulados azuis e colocando as bolotas fedorentas dentro de vários sacos de supermercado, um dentro do outro. Limpo o que é preciso limpar concentrada e relaxo dando risada com o fulano xereta que vem colocar a cara na caixa aberta e checar curiosamente o que estou fazendo. É um trabalho detestável, mas que eu faço com cuidado e dedicação. E acaba virando um momento de meditação, quando eu posso refletir sobre alguns fatos da vida. Como por exemplo, quando pensamos que estamos sendo espertos economizando dinheiro comprando uma coisa de qualidade inferior, achando que ninguém vai notar, que não vai fazer diferença, que é tudo a mesma coisa – mas não é! Areia pro banheiro dos gatos tem que ter qualidade, senão forma poeira, espalha pela casa toda, intoxica o ar numa fedentina insuportável, o bloco de xixi esfarela e a limpeza fica muito mais difícil e chata. Pode-se também usar o momento da limpeza do banheiro dos gatos para refletir sobre a impermanência de tudo, de como fazemos uma coisa hoje e temos que refazê-la amanhã, ou de como sempre alguém acaba limpando a sujeira do outro, mesmo que o outro seja um animal. O cristal azul quebra a frieza da areia cinza, o cheiro inebria, a textura hipnotiza, a pá que também é peneira faz desenhos circulares, os pedregulhos fecais são escuros e inertes, como, exatamente como, num pequeno e zen jardim japonês.
Mês: fevereiro 2007
um menu verde-amarelo
A proposta original para o feijão branco de ontem, antes do cortão no dedo, era essa Salada Toscana. Hoje cozinhei mais feijão e fiz. É a coisa mais fácil. Temperar o feijão já cozido no alho, sálvia e azeite e escorrido, com sal, pimenta do reino moída fresquinha, mais azeite – muito azeite – e um tantinho de vinagre balsâmico. Misturar bem, ralar bastante queijo parmesão, no ralo grosso. Colocar esse feijão branco temperado por cima de folhas de rúcula. Só isso!
Estava com tanta cenoura da cesta orgânica acumulada na geladeira e comecei a ver um monte de receitinhas de sopa de cenoura com gengibre pelos food blogs. Me inspirei e fiz a minha. Muito simples, muito boa.
Refogue scallions e gengibre picado num pouco de azeite. Acrescente as cenouras em cubos. Refogue mais um pouco. Acrescente caldo de legumes o suficiente para cobrir as cenouras. Eu usei a água em que cozinhei o feijão, acrescida do alho cozido e um copo pequeno de vinho branco. Rale a casca e esprema o suco de uma laranja pequena. Deixe cozinhar, cozinhar, até a cenoura ficar molinha. Bata com o mixer manual ou no liquidificador até ficar um purê. Acrescente sal, um pouquinho de pimenta vermelha seca. Deixe ferver um minutinho e desligue o fogo. Sirva com uma bolota de sour cream e um raminho de coentro. Ficou uma sopa suave e picante ao mesmo tempo, com o doce da cenoura e da laranja sendo quebrado pela pungência do gengibre.
As torradinhas foram feitas com tortilla bread cortadas em quatro, mas pode fazer com pita ou mesmo pão de forma. No mixer coloque salsinha e queijo parmesão ralado e misture bem, formando uma farofa. Misture essa farofa numa quantidade de manteiga em temperatura ambiente. Tranforme tudo numa pasta e passe nos pãezinhos. Asse em forno baixo até eles ficarem crocantes.
In-N-Out
Vai ser deveras difícil alguém me pegar num fast-food qualquer mordendo um hamburguer. Eu abomino quase todas essas redes, a comida oleosa, o cheiro de gordura que impregna tudo, a cara encardida desses locais – pelo menos pra mim todos eles são fedidos e encardidos. Mas tem UM lugar que eu vou de vez em quando. É a rede californiana In-N-Out, que diferente dos MacGororobas da vida, servem o mesmo diminuto porém honesto menu desde 1948, quando a primeira lanchonete inaugurou no sul da Califórnia. No In-N-Out você tem três opções de sanduíches: hamburger, cheeseburger e um double cheeseburger, para os mais famintos. Além das batatas fritas, das sodas e milk shakes. Os preços são absurdamente em conta e o mais importante, no In-N-Out tudo é fresco, não tem nada congelado ou pré-cozido. A cozinha é aberta, então tanto no drive-thru quando dentro da lanchonete, você pode ver o pessoal preparando os sandubas, cortando as batatonas numa maquininha e fritando ali na hora, tudo fresquinho, nada de batata saída do freezer. O resultado desse capricho é que os In-N-Out vivem lotados. Bons preços e qualidade, além da rapidez conveniente da fast-food, mas sem aquele peso na consciência. Ah, tambêm tô sabendo que o In-N-Out é bom empregador [diferente dos seus colegas mais famosos] e paga as melhores wages. Atraí muitos estudantes para trabalhar lá, também porque promove trabalho voluntário que é exigência de currículo. Eu como lá de vez em quando. Nesse dia chuvarento pedi duas porções de french fries, que me custaram menos de três patacas e estavam de-li-ci-oo-sas!
tão bonitinha
cenoura.. ouch.. feijão…
Eu planejava um jantar um pouquinho diferente. Fui interrompida por um cortão no dedo e precisei chamar o marido, que veio galopante—hm, quase. Terminamos tudo daquele jeito, eu dizendo faça isso, faça aquilo e bufando, porque ele fazia tudo atrapalhado. No final o jantar vingou e até que ficou bom.
Vi a receita Carrots in Vermouth no blog Accidental Hedonist e fiz um pouco diferente. Refoguei as cenouras cortadas em palitos num pouquinho de óleo. Quando elas começaram a dourar, joguei uma dose de whiskey, mexi bem, desliguei o fogo, coloquei sal e pimenta moída e salpiquei com salsinha fresca. Não deixei cozinhar mais, porque queria manter a crocância natural da cenoura. Nem preciso dizer que eu A-D-O-R-O usar bebida álcoolica em receitas. ADORO mesmo! Se a receita tem bebida, já vai pra minha lista.
A outra receita tirei do livro The New Vegetarian Epicure – Tuscan White Beans with Garlic and Sage. É simplérrima. Coloquei umas 400gr feijão branco de molho de manhã cedo. À noite, coloquei pra cozinhar com água, folhas frescas de sálvia, um dente de alho e uma colher de sopa de azeite. Cozinhou, cozinhou, em fogo baixo e com a panela tampada. Os feijões devem ficar macios, mas inteiros. Adicione sal. Transfira o feijão e o caldo que deve ficar grosso para uma travessa. Tempere com mais azeite e com pimenta moída. Nós comemos quente, mas esses feijões podem ser comidos frios, em saladas ou antipasti.
coisas guardadas nos livros
Eu tenho essa mania de guardar coisas no meio dos livros de receitas. Quando abro um, sempre acho coisas inusitadas. Normalmente tem sempre um recorte de jornal ou um cartão com coisas anotadas na minha letra de mão garranchuda. Foi uma emoção quando abri um deles e achei essa fotografia fofa. Sempre me surpreendo. Outro dia, estava procurando uma receita e achei um 3×4 da década de 80 – eu com um MULLET horrorrripilozo! Tive até um ataque de riso, porque não pude acreditar que eu tive um corte mullet. O que eu estava pensando da vida? Ah, a imaturidade… Agora como e por que essa foto foi parar lá no meio do livro de receitas, só deus sabe…
bolo de cranberry & abóbora
Peguei essa receita na Sher, minha vizinha. Como eu ainda tinha uma abóbora grandona e um saco de cranberries frescas, decidi fazer. Optei pelos cupcakes porque queria usar essas forminhas de flores psicodélicas, que achei uma gracita!
O bolinho ficou saboroso e fofinho. Dei um para a minha amiga provar e ela achou delicioso. Então decidi levar uma dúzia deles para os meus colegas de traballho. Vira e mexe tem um “treat” deixado por alguém no balcão da nossa mini-cozinha improvisada. Hoje foi a minha vez. Sou super insegura com os meus cozinhados e fiquei meia tensa – será que eles vão comer, será que eles vão gostar? A técnica veio dizer que os cupcakes estavam deliciosos. No meio da manhã passei pela cozinha e mais da metade dos bolinhos tinham sido comidos! Fiquei tão contente! Acho que alimentar as pessoas com coisas saborosas dá tanto prazer quando dar um presente. Vou repetir a experiência e aproveitar pra melhorar os meus “baking skills”.
cranberry-pumpkin cake
1 xícara de polpa de abóbora cozida
1 xícara de açúcar
1/4 xícara de água
2 ovos
1/4 xícara de óleo vegetal
2 xícaras de farinha de trigo
2 colheres de chá de fermento em pó
1/2 colher de chá de sal
1/4 colher de chá de bicarbonato de sódio
1/4 tcolher chá de canela em pó
1/4 colher de chá de gengibre em pó
1/8 colher de chá de cravo em pó
1 xícara de cranberry frescas [não descongele, se elas estiverem congeladas]
Pré-aqueça o forno em 350°F/180ºC. Unte a forma de pão ou de muffins, ou forre a forma de muffins com as forminhas de papel. Numa vasilha grande bata bem a abóbora, o açúcar, a água, os ovos e o óleo. Peneire por cima dessa mistura, a farinha, o fermento, sal, bicarbonato e as especiarias. Bata bem até a massa ficar bem lisa. Jogue as cranberries e coloque a massa nas forminhas. Asse por mais ou menos 30 minutos para as formas de muffins ou 1 hora e 15min para a forma de pão. Deixe esfriar numa grade. Essa receita faz um bolo ou 18 bolinhos.
Capinar, pra despois prantar
Fez um dia tão lindo e agradável no domingo, que finalmente eu criei coragem, vesti as galochas e fui até o quintal para avaliar os estragos do inverno na minha horta. Estava tudo um matagal! Nós não somos pessoas que praticam o gardening como hobby. Somos relapsos e do tipo que só faz por necessidade, ou pagar alguém pra fazer. Estou pensando que vou precisar novamente dos serviços de um jardineiro. As lavandas estão enormes, as roseiras ainda ostentam algumas flores deprimentes e descoloridas, e a horta – ah, a horta – estava um caos! Toda esburacada pelo malditinho do gopher que aparece todo inverno e faz um tremendo estrago por todo canto. Os pés de tomates todos secos, apodrecidos e engruvinhados, ainda ostentavam uns míseros e persistentes tomates, alguns furados de bicho. O matagal corria solto. Das ervas, sobraram um pingo de tomilho, um ramo de sálvia, uns brotos de orégano e umas cebolinhas francesas. Ah, renascendo está o hortelã, que esse você pensa que se livrou, mas ele persiste, como uma praga – o que realmente ele é. Dizem que se deve plantar hortelã em vasos e não no chão, como eu fiz, pois ele espalha como uma erva daninha, com uma raiz que toma conta de tudo. Esse é o caso de uma das caixas da minha horta, totalmente tomada por esse hortelã escuro, chamado de Menta Chocolate.
Usando minhas luvas velhas do ano passado, todas furadas e deixando os dedos pra fora, agarrei a enxada e o ancinho e mandei bala. Removi os pés secos de tomate, parte do mato, revolvi um pouco da terra. Enquanto fazia isso, pensava o que vou fazer na minha horta neste ano. Ela consiste de três caixas quadradas e largas de terra – que eles chamam aqui de “bed”, rodeadas por cerquinha de madeira com portãozinho, um mimo. Numa caixa eu sempre planto 4 ou 5 pés de tomates. Nas outras eu variava, mas neste ano estou pensando em enchê-las com ervas, nada mais. Não tô podendo me aventurar em nada que dê muito trabalho neste momento. Mas estou planejando aproveitar muito o meu quintal, como fazia em outros anos. Mas ele está precisando de um make over, porque depois do frio e das chuvas fica tudo com uma cara de desolação. Logo terei muitas flores, e já será hora de plantar coisinhas. Mas fevereiro é o mês de pegar na enxada. E dá-lhe muque!
Crops of the Americas
Volver
Fazia tempo que estava querendo ver esse filme, em cartaz no Varsity, o cinema independente bacanérrimo de Davis, com as cadeiras mais confortáveis que eu já sentei na minha vida! Domingo, já tinha tomado banho e ia deitar e ver um filme, ler, escrever – sim, faço tudo ao mesmo tempo – quando minha amiga ligou e convidou, vamos?
O filme é um primor, um novelão lindo, Pedro Almodóvar em cada frame e diálogo. Mas me chamou a atenção logo de cara os detalhes de comida – 0 lindo jogo de chá na casa da Tia Paula, os bolinhos fritos, a carne assada recheada, o caldo levinho do funeral, a carne em conserva, o pão, os mojitos [e um cartaz dizendo autêntica “caipirinã”], o maravilhoso pudim de leite e os franguinhos empanados. Volver é uma fartura para os olhos e para a alma. Nós adoramos e viemos comentando entusiasmadamente pela rua, enquanto voltávamos à pé para casa.