Que atire a primeira pedra quem nunca fez uma pataquada dessas: separar a receita, sair pra comprar os ingredientes, voltar e começar a arranjar tudo, fazer o mise en place e notar que dois dos ingredientes principais, insubstituíveis, estão faltando. Eu faço isso o tempo todo, mesmo escrevendo e carregando listas, mesmo checando e re-checando. É como ler a receita várias vezes e mesmo assim esquecer de acrescentar um ingrediente—e logo aquele que vai fazer diferença, interferir no resultado, provocar o total fracasso.
Ainda bem que era um domingo e eu estava inteiramente à disposição de fazer a tal receita. Primeiro passei no Co-op e comprei coisas, muitas coisas. Depois voei até a árvore de ninguém, empastelei a sola dos meus sapatos com aquele grude de figo podre com grãos de pedra e apesar de usar luvas, fiquei com um braço coçando. Voei novamente para casa, onde a gataiada nem conseguia dormir, tal era o meu entra e sai. Reli a receita, em português e inglês e fui me preparando para transformá-la num estrondoso sucesso quando vi que não tinha um dos ingredientes principais—que eu jurava que tinha, e o outro tinha só metade da quantidade necessária. A frustração que eu senti não teve medida. Voltei ao Co-op tão fula da vida e soltando bufadas pelas ventas, que até esqueci de revestir os sapatos e só fui notar quando cheguei no supermercado que estava vestindo meus chinelos de dedo encardidos. Corri para pegar os ingredientes faltantes sem me permitir olhar mais nada e entrei na fila do caixa que ainda não tinha me atendido naquele dia.
A receita foi realizada, com um errinho aqui, outro ali. Nada grave. O único problema que me aflige agora é—quem vai comer tudo isso? Pior que inventar moda, esquecer ingredientes e ficar num pra lá e pra cá frenético, é inventar moda e não ter ninguém pra dividir a história e os garfos.