all I got was this lousy t-shirt

Uma das coisas boas de viajar é poder provar comidas diferentes. Eu não sou fã de viagens, especialmente do trajeto ida-volta e dos confinantes avião, carro, trem, navio. Mas curto ficar uns dias fora, deixo bem claro: UNS DIAS! Quando viajo – e até que tenho viajado, pois apesar de cabrita empacada quero conhecer o mundo, me divirto com a parte de alimentação. No Brasil é sempre uma farra gastronômica, um empanturramento pantagruélico. Em outros países é aquele excitante e zeloso pisar em ovos, um cuidado com o que pedir, decifrar os hieróglifos da escrita e fala desconhecida, morder com curiosidade e temor, se surpreender e se deleitar com novos sabores. Sempre que viajo faço uma visita ao supermercado local. Pra mim é uma diversão, tanto quanto bater ponto nos cartões postais turísticos, ou pensando bem, melhor! Fico horas vagando pelos corredores, olhando ou lendo embalagens, descobrindo coisas novas, ou até mesmo a grande surpresa: isso tem lá em Davis!
Mas minha visita mais longa e inesquecível à um supermercado, foi a segunda que fiz ao Real Canadian Superstore. Na primeira, fui acompanhada pela pentelhuda da prima do meu marido, que deu palpite em tudo e me guiou pelo supermercado conforme o esquema dela, jogando coisas que ela comprava mas que eu nunca compraria no meu carrinho, falando pelos cotovelos e não me deixando ver, nem decidir nada. Fomos pra casa, eu guardei as trancas que ela me fez comprar e no dia seguinte voltei lá de bicicleta. Passei quase três horas dentro do lugar, que era enorme, olhando corredor por corredor, prateleira por prateleira, produto por produto, tentando me familiarizar com as diferenças, me inteirar das novidades, decifrar ingredientes e planejar os novos rumos da minha maneira de cozinhar dali pra frente.

Biddy e o homem do abacate

Eu vou pulando de livro em livro. Não tenho vergonha de confessar a minha volubilidade. Pulei desta vez para Serve it Forth da M.F.K.Fisher, e li um capítulo muito apropriado entitulado On Dining Alone, onde a autora primeiro conta a divertida aventura gastronômica de Biddy, uma garota de dezesseis anos que descobre os prazeres da mesa soziinha num restaurante kosher em Los Angeles.
Logo a seguir, Fisher descreve o homem que sempre jantava sozinho num restaurante que ela frequentava. Ele sentava-se num mesa de canto, vestido de maneira formal e antiquada. O homem comia frugalmente e bebia meia garrafa de vinho acompanhando a comida. E para sobremesa ele sempre pedia a mesma coisa: um abacate, que era trazido até ele envolto num guardanapo. O homem apalpava a fruta delicadamente e a cheirava, então fazia um sim com a cabeça, aprovando. O abacate era então cortado ao meio com uma faca de prata e o homem retirava a casca e a semente de um lado, colocava a fruta delicadamente no prato e enviava a outra metade de volta para a cozinha. Açúcar de confeiteiro era então trazido e colocado na cavidade da fruta. Finalmente o Sommelier aparecia com uma garrafa de kümmel russo em formato de urso e colocava um copo cheio da bebida sobre açúcar, esperava o homem aprovar e se retirava. O kümmel desaparecia na montanha de açúcar colocada no centro do abacate, enquanto o homem mexia e amassava a fruta com delicadeza. Finalmente ele comia, colherada após colherada…
Adorei essa história, e fiquei incrivelmente inspirada par testar novas maneiras de comer o abacate!

amoreco

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Passei por ela na lojinha de antiguidades e ganhei uma piscadela – hey, you’re a swell gal! No mesmo minuto decidi que ela seria minha. Impossível resistir à uma jarra com essa cor e esse design moderno – tão típico da década mais bacana do século vinte – os anos trinta.

sopa de couve-flor com gorgonzola

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Li em algum lugar uma receita assim, de couve-flor com gorgonzola e fiquei bem animada, pois ainda tinha um buquê da couve que comprei para o risotto. Também tinha um tantinho de gorgonzola, que queria gastar, depois do trauma da abóbora! Não achei a receita, então foi sem mesmo.

Assei os floretes de uma couve-flor pequena regados com azeite em forno alto. Numa panela fritei um dente de alho num pouquinho de azeite. Juntei os floretes assados e 1 litro de caldo de legumes. Deixei ferver por uns minutos e então triturei a couve-flor dentro da panela mesmo, com o mini-mixer de mão. Voltei a panela para o fogo e acrescentei meia xícara de half-half [pode ser creme de leite fresco], o gorgonzola [que deu mais ou menos uma colher de sopa] e um cubinho de queijo brie que eu queria terminar. Deixei o queijo derreter, desliguei o fogo, coloquei sal e pimenta do reino moída na hora a gosto. Voalá! A sopa ficou cremosa com pedacinhos molinhos da couve-flor e como o gorgonzola desta vez foi discreto, o sabor predominante foi mesmo o do legume.

cor-de-rosa & fumegante

Faz tempo que estou pensando numa coisa e hoje fui checar alguns websites listando cafés em Saskatoon, Saskatchewan. Num deles, cliquei num mapa e quando vi os nomes das ruas e dos parques da cidade onde morei por tantos anos, senti meu coração doer daquele jeito estranho que só as memórias do passado conseguem fazer doer. Isso aconteceu porque lembrei de uma coisa boa dos meus invernos em Saskatchewan. E era obviamente uma bebida: um leite fervendo aromatizado com um xarope de fruta e servido em tigelas brancas de cerâmica. Não me lembro como era chamado, só lembro que entrávamos num café de esquina no final da Broadway Ave e pedíamos o leite com sabor de morango ou framboesa, que vinha fumegando dentro da tigela e bebíamos segurando com as duas mãos. Era para aqueles dias frios, pra descongelar os ossos. Minha lembrança mais querida é do dia que fui lá com a minha irmã. Deusdocéu, ela sofreu naquelas cinco semanas de invernão que passou lá com a gente! Quando eu contava do frio de Saskatchewan, parecia tudo uma piada. Mas minha irmã sentiu na pele que nada daquilo era brincadeira. Um dia fomos fazer não-sei-o-que na Broadway e estacionamos o carro na rua. Era o tempo de atravessar a rua ou andar um mísero quarteirão e já estávamos com as pestanas cheias de gelo. Os olhos eram a única parte do corpo que ficava descoberta. Tínhamos que enxergar e iria ser o cúmulo da ridiculice, além de toda a fantasia de esquimó, ainda ter que usar goggles. Nesse dia entramos no tal café – que não lembro o nome e pelo jeito não existe mais – completamente transtornadas, com as pestanas cheias de gelo, e pedimos duas tigelas de leite com sabor de framboesa. Bebemos sentadas ainda de casacos, cachecol, touca, com as bochechas vermelhas, as pestanas molhadas. O leite fervendo foi esquentando o nosso corpo e a nossa alma. Fomos ficando mais relaxadas, menos transtornadas, fomos tirando os mil traquelaques invernais, tiramos o casaco e ficamos conversando por um tempao lá dentro do café aconchegante e cheio de gente tomando leite, chá, café, lendo livros ou jornais ou conversando, como nós.

te vi no jornal!

Acordei no domingo de manhã para a matéria da Claire no jornal Davis Enterprise, que já estava enroladinho no tapete da porta de entrada. Eu estava um pouco preocupada com relação ao texto e fotos, afinal falei até não poder mais, nem lembrava mais se tinha falado alguma abobreta comprometedora. Mas foi uma surpresa ler a excelente matéria da promissora jornalista. O fotógrafo também fez um trabalho caprichado e a edição foi bem criativa, ilustrando a história com a foto do Brendon cozinhando meticulosamente, eu comprando produtos orgânicos no Farmers Market e o Garrett sendo a criatura charmosa que ele naturalmente já é, sentado no café mais gostoso da cidade, o Ciocolat. Estava esperando os meus companheiros blogueiros escreverem sobre o evento, mas pelo jeito vou ser a primeirona!
Essa foi uma das poucas vezes que gostei ter sido colocada no spotlight. Meu vizinho veio me dizer – hei, te vi no jornal! É a primeira vez que saio numa matéria na cidade onde eu vivo, onde as pessoas podem me reconhecer. Thrilling!
* ainda não há versão online, mas tirei fotos da primeira e segunda páginas da matéria.

Operação Resgate: as pêras

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Que atire a primeira pedra aquele que nunca deixou uma fruta estragar na cesta. Infelizmente eu faço muito disso, porque não guardo nenhuma fruta na geladeira, nem mesmo durante o verão. Então vira e mexe tenho que acionar a Operação Resgate para bananas, maças, morangos. Ontem foi a vez das pêras. As pobres coitadas estavam quase se desmilinguindo e achei que precisavam urgentemente virar uma torta.

Assim então, sem paciência de procurar receita de torta de pêra, resolvi fazer a minha própria, de cabeça – oh, não, DANGER WILL ROBINSON, DANGER!!

Peguei uma caixa de massa para torta pronta [usei Pillsbury, mas qualquer uma serve]. Forrei uma forma funda com uma das rodelas da massa. Descasquei e cortei todas as pêras quase desfalecidas em fatias. Preparei um molhinho com os seguintes ingredientes:

1 xícara de leite integral
1 ovo
1 colher de sopa de maizena
1/4 xícara de açúcar
1/4 xícara de vinho marsala seco

Engrosse num creme em fogo médio. Misture as pêras ao creme e coloque tudo na forma forrada com a massa. Cubra com outra rodela de massa, faça cortes com a faca e decore com açúcar demerara. Asse em forno pré-aquecido em 365ºF/180ºC por 45 minutos. Retire do forno e deixe esfriar. Essa torta fica melhor servida fria, de preferência no dia seguinte.