Categoria: cotidiano
alto verão
Essa é a época do ano em que eu fico super animada com a avalanche de tomates, melões, pêssegos, figos, com os dias longos, quando dá pra fazer tantas coisas até ser finalmente derrotada pelo cansaço e pela luz rosada do cair da noite. Mas por outro lado já vou ficando um pouco exausta com os dias calorentos, desejando uma brisa mais refrescante, uma mudança de direção. Vou aproveitando o que o verão tem de bom e olhando para o horizonte, na expectativa do que vamos ter pela frente.
Ando trabalhando muito, muito mesmo e quase não tenho mais tempo pra nada. Pra adicionar mais trabalho em cima do trabalho, temos hospedes na casa. Além do gato Roux, que passou uns meses andarilho pelas ruas de Woodland e retornou ileso para a nossa imensa alegria, agora temos os gatos Tim e Sequel, que ficarão aqui em casa até fevereiro. Eles são os gatos do Gabriel, o meu filho que está passando alguns meses vivenciando a rotina brasileira. A adaptação foi mediana—ninguém ficou amigo, mas também ninguém ficou inimigo, o que já é um grande alivio. Roux mudou, de gato espevitado virou um gato zen, quase reservado, alheio ao bafáfa. Tim é o gato velcro, que cola nas pessoas de uma maneira até engraçada. É o pomponzão que agora senta no meu colo quando estou tomando meu café da manhã. Sequel é o gatinho bully, o menorzinho de todos e o mais audacioso. Tem uma micro vozinha e fala comigo pedindo sei lá o que mas não gosta de muita aproximação. Tim e Sequel cresceram juntos e são super amigos, então a situação é de dois contra um—um pouco injusto, eu sei. Como não bastava a casa estar cheia de gatos se estranhando, aportou também por aqui uma cachorra, que vai ficar hospedada em casa por três semanas. Ela é velhinha, gigante e dominadora, tem ciúmes dos gatos e fica colada em mim o tempo todo. E são duas caminhadas por dia, que até que consegui encaixar bem no meu esquema apertado.
Este verão está um pouco diferente, então não vou ficar escrevendo sobre os tomates, os campos de tomate, a colheita do tomate, o festival do tomate, eteceterá. Neste verão eu estou botando mesmo os bofes pra fora com cachorra e com gatos, mas compenso bebendo cocktails, devorando saladas e toneladas de frutas, e me fartando daquele vinagre que tenho oferecido pra todas as minhas visitas. É muito engraçado ver a reação quando eu digo—quer beber um vinagre? E depois ver a cara de surpresa e prazer que todos fazem ao sorver o liquido borbulhante e refrescante. Saúde!
summer breeze makes me feel fine
beauty is in the eye of the beholder
Já faz um tempo que estou querendo tocar neste assunto, já que está mais do que claro para os frequentadores desde blog que eu abandonei o uso das firolices fotográficas por aqui. A câmera está num canto, as lentes estão no mesmo canto e tudo o que eu fazia antes com relação à produção de imagens para publicar neste espaço eu não faço mais. O que eu faço agora é o que considero o mais viável para esta fase da minha vida em que o tempo anda escasso. Carrego aquela gadget multi-tasking super-poderosa faz-tudo comigo pra onde vou, o tempo todo. E é com ela que tiro fotos. Neste momento isso incluí absolutamente todas as fotos que aparecem por aqui. Se não fosse essa maravilhosa gadget combinada com o mais funcional aplicativo de manipulação de fotos, este blog já teria morrido à mingua. As fotinhas com filtro do tão criticado instagram foi o que me restou, porque eu simplesmente não tenho mais tempo para fazer mil cliques com câmera, trocar lentes, editar dezenas de imagens, escolher as melhores, eteceterá. Com a dupla iPhone-instagram eu posso ser rápida, não perco tempo, a comida não esfria, não pago mico em público, não preciso carregar equipamento, não preciso me antecipar pra nada, porque na hora que a oportunidade aparecer eu estarei pronta para ela. Isso não quer dizer que não preciso ter um minimo de cuidado. Muito pelo contrário, preciso ter um certo timing, ter um olho apurado pra captar a essência da imagem e da mensagem que quero passar e preciso ser bem rápida no gatilho, ter a mão firme e ser decidida, porque muitas vezes só me dou aquela única chance, não fico escolhendo pose, apenas enquadro e clico. Já me senti um pouco culpada por ter adotado esse esquema mais fácil, porque percebo que há uma tendência geral pelas imagens mais profissionalizadas. Mas cada momento é único pra cada caso e pessoa. E o meu momento é esse—me falta tempo e paciência, mas não me falta vontade de criar. Assim então, para satisfação ou desgosto do freguês, continuarei até quando resolver mudar.
all the good things
[ the end of may ]
how can you have the blues?
a verdadeira história da foto mais fantástica de todos os tempos
Estávamos trabalhando, quietos e concentrados, quando o meteorologista entrou na sala todo esbaforido, pegou a câmera que ele sempre carrega na mochila e fez sinal para que o seguíssemos, pois aparentemente ele tinha visto algo absolutamente incrível do lado de fora do prédio.
Explicarei primeiro que tivemos semanas e mais semanas de uma ventania brutal, que arrancou árvores pelas raízes, forrou o chão de galhos, de folhas, de flores, desorientou os motoristas e ciclistas, levantou saias, derrubou pássaros no voo, descabelou penteados, mudou coisas de lugares e deixou as pessoas confusas.
Corremos atrás do moço com a câmera naquele dia de ventania. Ele parou bem em frente ao arbusto de feijoa e numa pose de paparazzi ajustava a lente para captar a imagem incrível daquela bolsa pendurada num dos galhos da planta. Ficamos todos com cara de ué olhando pra ele e pra bolsa, pra bolsa e pra ele, pra ele e pra bolsa, até que eu resolvi me pronunciar—essa é a minha bolsa de lanche que eu pendurei aí hoje pela manhã pra secar, porque vazou molho de salada e eu tive que lavá-la.
Fuén geral. Voltamos cada um pro seu cubo e pro trabalho, mas antes tive que ouvir o meteorologista e fotógrafo de imagens bizarras reclamar—você acabou de estragar a foto com a melhor história de todos os tempos: o vento trouxe a bolsa de longe e ela acabou aqui pendurada neste galho. [ SORRY! ]
[ if it ain’t love ]
[ almoço literário ]
Sentei no meu banco favorito para almoços no campus e atrás de mim veio um grupo de jovens. Um deles sorriu pra mim e sentou-se na grama à uns poucos palmos de distância dos meus pés. Os outros o seguiram e sentaram-se também, formando um círculo. Junto deles estava a professora, uma moça indiana que falava inglês com sotaque britânico e tinha o lenço mais lindo do mundo enrolado displicentemente no pescoço. Era uma aula de literatura outdoors, bem ali na minha frente. A professora elogiou o dia lindo e frisou como todos estavam com a cara muito mais felizes do lado de fora do prédio. É assim mesmo que todos se sentem quando uma aula é libertada das quatro paredes e toma posse do verde da paisagem externa.
Eu tinha meu guardanapo estendido no colo, onde equilibrava potinhos abertos sobre um prato de bambu. Daquela distância não pude evitar de me tornar uma extensão do grupo e ouvir toda a discussão conduzida pela professora. Eu dava garfadas na minha versão improvisada de uma açorda de camarões e ouvia a opinião dos estudantes sobre os personagens do livro—The Ramayana. A saga de Rama, Sita, Lakshmana, Surpanakha e de como os alunos a percebiam e a interpretavam. Comi a açorda e mergulhei floretes de brócolis e palitos de cenoura cozidos num molhinho de tomate e devorei com cuidado os pedaços de abacaxi assados com açúcar de palmeira. Comi bem devagar, sem fazer barulho ou sujeira, como se estivesse mesmo naquela aula. E depois de ouvir algumas das manifestações dos alunos sobre a grande epopéia Indu, talvez eu precise [ou deva] ler também o livro.