um encontro com Michael Pollan I

Michael Pollan está em casa em Berkeley. Antes do inicio do evento, enquanto as pessoas se acomodavam nas cadeiras do auditório lotado do Wheeler Hall, no centro do campus da Universidade da Califórnia, ele conversava com alunos, colegas e fãs. Descontraído e simpático, Pollan subiu ao palco sem delongas e fricotes de celebridade, para ser entrevistado por Cynthia Gorney, sua colega no Graduate School of Journalism.

A professora Gorney começou a entrevista contando que jantou com Pollan no Café Rouge em Berkeley e que podia afirmar que ele é um sujeito normal, que come com garfo, faca, usa guardanapo e se vira muito bem com copos de vinho. Na sequência Gorney perguntou o que toda a platéia gostaria de saber—Michael, o que você comeu no jantar? Ele descreveu um menu bem simples, preparado na cozinha da sua casa em Berkeley: macarrão integral com atum em lata, azeitonas e limão. Claro que o atum é o de melhor qualidade, cuja pesca não põe os golfinhos em risco e tudo o mais era orgânico e local.

Pollan fez um apanhado geral do seu novo livro In Defense of Food: An Eater’s Manifesto, comentando também o best-seller O Dilema do Onívoro. Foi uma conversa agradável, divertida e instrutiva, entre Pollan, Gorney e o público, que participou com perguntas por escrito. Pollan falou sobre muitas coisas, muitos tópicos importantes, recebeu aplausos com alguns dos seus comentários e o tempo todo se via muitas cabeças, inclusive a minha e a da minha amiga Eliana, se movimentando em concordância à tudo o que ele falava.

Pollan conta que muita gente chega até ele confessando que não está conseguindo avançar na leitura do O Dilema do Onívoro por puro temor do que virá pela frente. Os leitores assustados dizem que têm medo de chegar ao final do livro não conseguindo comer mais absolutamente nada. Mas Pollan afirma que quando o público sabe de onde vem a sua comida, ele consegue tomar decisões mais acertadas sobre a sua dieta. Segundo Pollan a indústria dos alimentos necessita de um sistema com transparência máxima. Se as paredes dos matadouros fossem de vidro e qualquer pessoa pudesse observar como os animais são abatidos nesses lugares, muita coisa iria mudar e essa seria a melhor maneira de fazer uma limpeza geral em todos os níveis do esquema industrial de processar alimentos.

Para Pollan, está tudo errado com a maneira como nós nos alimentamos. No In Defense of Food, Pollan detona sem pena as milhares de pesquisas nutricionais que, como num samba do crioulo doido, ditam modas, impõem diretrizes, mudam dietas e crucificam ou endeusam certos alimentos, fazendo de todos nós escravos da comida, que acaba sendo consumida por causas dos seus beneficios nutricionais e não por motivos mais singelos, como sabor e prazer. Para Pollan, o resultado dessa confusão toda é que a indústria dos alimentos está produzindo pacientes para a indústria de saúde [ou de doenças, se você preferir].

A solucão para essa enrascada onde nos enfiamos, transformando o ato de comer numa atividade puramente mecânica e carregada de pressa, estresse e culpa, é simplesmente voltarmos a fazer como fazíamos antes, e isto quer dizer apenas voltar a cozinhar com ingredientes de verdade, não produtos processados. Pollan recomenda se que gaste mais dinheiro e mais tempo comprando e preparando nosso alimento. O custo da comida barata é mais gasto com a saúde, ele afirma. Gasta-se um pouco mais com produtos de melhor qualidade, compra-se e come-se menos, porque ninguém precisa comer carne todos os dias, beber litros e litros de leite e se entupir de toneladas de comida em todas as refeições.

Para quem argumenta que vivemos numa sociedade corrida, que todos trabalham, que ninguém pode perder horas do dia labutando na cozinha, Pollan responde: você arruma tempo para fazer as coisas que valoriza. Há tempo de sobra para assistir tevê, jogar golfe ou navegar na internet, por que não há tempo suficiente para se preparar uma refeição simples e honesta, com ingredientes frescos e saudáveis?

Pollan recomenda que se invista numa cesta orgânica [as CSA que ele diz adorar!], comprar local nos Farmers Markets e fazer sua própria horta. Ele também diz que se der saudades de porcarias a regra é: pode-se comer toda a junk food que se quiser, desde que se faça a sua própria. Se você tiver que fazer batata-frita em casa, quantas vezes por ano vai comer essa delícia? Muitos aplausos!

Pollan é um homem alto, com os pés mais gigantescos que eu já vi na minha vida e com um sorriso espontâneo e largo. Me pareceu mais velho pessoalmente do que eu havia imaginado. Mas a simpatia é visível e contagiante. Logo depois da palestra ele foi para o hall de entrada do teatro autografar livros. Ouviu, conversou e interagiu com cada um dos seus fãs. Eu esqueci de levar meus livros, mas minha amiga Eliana levou o dela e ganhou um autógrafo sugestivo—eat good! Nós comentamos que ele não parece ter sido contagiado com a celebridade que alcançou. E com certeza não será, porque apesar dele estar desempenhando esse importante papel de guia, ele dá a impressão de estar caminhando ao nosso lado e não na nossa frente e isso é funciona como um incentivo fora do comum.

Alguns mandamentos de Michael Pollan
.Não coma nada que a sua avó não consiga reconhecer como comida.
.Evite comidas que contenham ingredientes que você não consiga pronunciar.
.Evite comer qualquer coisa que não apodreça.*
.Evite produtos que prometem benefícios para a sua saúde.
.Compre produtos nas áreas periféricas do supermercado—os perecíveis.
.Melhor ainda, não compre em supermercados, mas sim nos Farmers Markets, ou assine uma CSA.

*Pollan carrega pra cima e pra baixo há anos, um pacotinho com dois bolinhos industrializados, para provar que os trequinhos continuam perfeitos, fofinhos e sem nenhum bolor ou descoloração, mesmo com o passar dos anos——e-ca!

12 comentários em “um encontro com Michael Pollan I”

  1. Cheguei ao seu blog pelo google. Queria saber se no Brasil alguém também estava lendo o In Defense Of Food ou o Omnivore´s Dilemma. Adoro os livros do Pollan, li todos seus 5 livros, várias vezes. Tinha reservado o In Defense na Amazon desde outubro, antes do lançamento, ansioso para chegar janeiro e eu receber o livro. Fico impressionado pelo fato do Pollan passar em brancas nuvens aqui no Brasil. Um dia em uma de minhas rondas pelas livrarias, vi uma tradução do Omnivore´s. Mesmo já com uma tradução de um livro do Pollan, no Brasil ele continua ignorado, apesar de seu estilo delícioso de escrever, seu humor refinado e irônico, suas questões e divagações que fazem a gente reformular várias visões nossa, sobre a comida, nossa relação com a natureza e etc. Meu e-mail é rabramo@gmail.com. Se alguém quiser trocar idéias e impressões sobre os livros do Pollan, será um prazer para mim. Adorei o blog, dei um add no meus favoritos.

  2. Quando eu cheguei em Los Angeles, logo na primeira vez que fiz supermercado, comprei umas laranjas. Comi uma, nao gostei (demorei um tempao pra me acostumar com o gosto da comida lá) e esqueci as laranjas numa gaveta da geladeira. Um bom mês e meio depois fui limpar a geladeira e achei as tais laranjas, lindas, brilhantes, in tac tas. Nem preciso dizer do horror que senti né? Com o tempo descobri minha cestinha de produtos orgânicos, passei do albertson´s pro Trader Joe´s e depois Whole Foods e depois os farmers markets mais hippies…
    Nesse meio tempo li o Dilema… e aprendi a procurar a galinha de ouro (como meu marido chamava) porque nao como carne vermelha entao era importante saber de onde vinham as aves e os frutos do mar. Quando deixei a Califórnia já tinha sido atingida pelo bichinho do comer bem, e agora em novos mares (na Espanha) me debato com a dificuldade de encontrar tudo de novo, ainda nao tem cesta orgânica, nem galinha free range (Peço encarecidamente que se algum leitor da Fer conhece melhor que eu o caminho das pedras, que por favor me dê umas dicas) mas nao me arrependo das reformas feitas na minha vida culinária porque realmente faz bem pra gente, custa menos no longo prazo e transformou minha relaçao com a comida.
    Sempre faço esses comentários enorme…
    Mas anda queria dizer que estou louca pra ler The eater´s manifesto. Você leu? Gostou muito? Eu chorei tanto com o Dilema…
    beijo

  3. Fer, leio sempre seu blog, adoro os textos e as fotos, que muitas vezes me deixam com água na boca!
    Essa palestra deve ter sido o máximo! E concordo 100% com o que ele diz sobre a ditadura das pesquisas nutricionais… Um dia o café é o melhor amigo do homem; já no outro é o pior inimigo! No mês seguinte não se pode mais comer chocolate, ou isso ou aquilo. Impossível se sentir bem, estamos sempre fazendo algo de errado com relação à comiga. Eu, como sempre desconfiei dessas coisas, prefiro continuar com meu lema: tudo em exagero é ruim… mas se não exagerar, dá pra comer de tudo!
    Parabéns pelo blog!
    Ah, e Feliz Dia da Mulher…
    Bjs,
    Andréa

  4. Fantástica experiência, Fer! Quem me dera lá ter estado também. Obrigada por partilhar as experiências e as fotos e os mandamentos (bastante elucidativos…)!
    Bj grande

  5. Esses livros devem ser o máximo.
    Os mandamentos dão que pensar, achei muita graça ao primeiro, e realmente há muita coisa que a minha avó não reconheceria como alimento.
    Beijocas e bom fim de semana

  6. Essa palestra deve ter sido bem interessante, Fer! Aos poucos, está a mudar, não só as minhas ideias, como as de muitos leitores, certamente! :o) Tenho pena de estar neste país, neste momento, onde nada do que eu como, tem a qualidade que eu quero. Agora, encontrei um sítio onde vende carne fresca. Mas até agora, a carne que comia era muitas vezes já congelada. Conclusão: às vezes nem sabia o que comprar e não comprava nada. Espero um dia, pôr em prática toda esta informação que bebo do seu blog! :o)
    Beijinhos

  7. Querida Fer,
    Repetir o que penso e o qto eu agree eh ateh boring:)) Fico feliz por voce ter ido ao evento:))
    Qto serah que esse home calca de sapato??hahaha..Sera que ele bate o Shaq??:))
    Ahh..desde crianca ouvih em casa: “Melhor gastar com comida que com remedio”.NS, Sherlock:))
    Bjs Amiga..E Happy Friday, que a agencia nao me deixa em paz..
    Bri

  8. Oi, Fernanda! Que maravilha ver o Pollan de perto.
    Comer bem (de verdade) é um caminho sem volta, né?! Não dá para voltar pro esquema antigo. É isso que tenho sentido. Ele é uma inspiração e tanto.
    Mandei pro seu email algumas impressões sobre os CSAs aqui da área, etc.
    Beijos,
    Renata.

  9. Imagino o quao agradavel nao foi essa conversa entre voces Fer!
    Fico feliz q vc teve a oportunidade de ir conhece-lo pessoalmente e ainda mais q curtiu aos montes a palestra!
    Estou com voce, com Pollan e com uma alimentacao saudavel, cheia de comidinhas naturais e deliciosas, daquelas que apodrecem e que minha avo certamente iria aprovar!!
    Beijos!
    Ana

  10. aaaah, que invejinha branca!
    acabei de receber meu Omnivore’s Dilemma da Amazon (que já estou devorando) e amanhã pego meu In Defense of Food na Livraria Cultura.
    E nem acredito que até bem pouco tempo atrás eu nem imaginava que os boizinhos e as vaquinhas fossem alimentados com algo diferente de… grama.
    []s
    Luciana

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